A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência segundo a qual o fato de um julgamento ser realizado de forma virtual, mesmo com a oposição expressa e tempestiva da parte, não é, por si só, causa de nulidade ou cerceamento de defesa. Segundo o colegiado, não há, no ordenamento jurídico vigente, o direito de exigir que o julgamento ocorra em sessão presencial.
Com esse entendimento, os ministros mantiveram a decisão do relator, ministro Ribeiro Dantas, e negaram o pedido de um réu para retirar o seu recurso da pauta de julgamento virtual e encaminhá-lo para o presencial. O recurso, no caso, era um agravo regimental contra a decisão monocrática do relator que não conheceu do habeas corpus.
A defesa argumentou que a matéria em debate, de natureza técnica, deveria ser objeto de julgamento presencial para possibilitar uma discussão mais profunda. Além disso, haveria a possibilidade de uma eventual intervenção da defesa, se necessário.
O réu foi acusado de comandar uma organização criminosa dedicada ao tráfico de drogas em Porto Seguro (BA). Para a defesa, as interceptações telefônicas que geraram as provas da acusação foram autorizadas por uma decisão judicial sem fundamentação e sem a intervenção do Ministério Público.
Necessidade do julgamento presencial tem de ser demonstrada O relator disse que o Regimento Interno do STJ permite à parte se manifestar contra o julgamento virtual, mas “é evidente que o acolhimento do pleito depende da comprovação da necessidade do julgamento presencial ou de pedido para realização de sustentação oral”.
Segundo Ribeiro Dantas, embora a sustentação oral no julgamento de agravo regimental tenha sido possibilitada pela Lei 14.365/2022, a parte não a requereu ao interpor o recurso, mas apenas ao peticionar para requerer a retirada do processo de pauta.
Segundo o magistrado, mesmo nas hipóteses em que cabe sustentação oral, se o seu exercício for viabilizado na modalidade de julgamento virtual, “não haverá qualquer prejuízo ou nulidade, ainda que a parte se oponha a essa forma de julgamento, porquanto o direito de sustentar oralmente as suas razões não significa o de, necessariamente, o fazer de forma presencial”.
O ministro explicou ainda que, para evitar o julgamento virtual, seria preciso demonstrar que essa modalidade traz prejuízo à parte. No entanto, ele ponderou que a defesa não comprovou a necessidade de exclusão do processo da pauta virtual, “não sendo suficiente para tanto a mera alegação de que deve ser dada a oportunidade de acompanhamento do julgamento do recurso interposto e a indicação abstrata de relevância da matéria”.
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HC 83267
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, fixou três teses sobre a valoração e a admissibilidade de confissões feitas à polícia no momento da prisão.
O colegiado definiu que a confissão extrajudicial somente será admitida no processo judicial se feita formalmente e de maneira documentada, dentro de um estabelecimento público e oficial. Tais garantias não podem ser renunciadas pelo interrogado, e, se alguma delas não for cumprida, a prova será inadmissível. A inadmissibilidade permanece mesmo que a acusação tente introduzir a confissão extrajudicial no processo por outros meios de prova – por exemplo, pelo testemunho do policial que a colheu.
A segunda tese estabelece que a confissão extrajudicial admissível pode servir apenas como meio de obtenção de provas, indicando à polícia ou ao Ministério Público possíveis fontes de provas na investigação, mas não pode embasar a sentença condenatória.
Por último, ficou definido que a confissão judicial, em princípio, é lícita, mas, para a condenação, apenas será considerada a confissão que encontre algum sustento nas demais provas, à luz do artigo 197 do Código de Processo Penal (CPP).
As teses foram estabelecidas em um processo no qual o Ministério Público de Minas Gerais denunciou um homem pelo furto de uma bicicleta enquanto a vítima fazia compras em um supermercado. Após o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) condenar o réu a um ano e quatro meses de reclusão, a defesa recorreu ao STJ, sustentando que a condenação foi fundamentada em uma confissão extrajudicial – segundo o acusado – obtida sob tortura.
Admissão de confissão extrajudicial depende da adoção de cautelas institucionais O relator do recurso, ministro Ribeiro Dantas, comentou que, quando o preso é devidamente registrado no sistema de custódia e recebe a orientação jurídica adequada antes de ser ouvido na delegacia, fica mais complicado para um policial mal-intencionado torturá-lo para obter informações, pois nesse momento já há um nível de formalidade maior, que é mais difícil contornar.
Assim, de acordo com o relator, para que a confissão extrajudicial seja admitida no processo, é necessária a adoção de cautelas institucionais que neutralizem os riscos, de modo a tornar a prova mais confiável. “Sem salvaguardas e enquanto o Brasil for tão profundamente marcado pela violência policial, sempre permanecerá uma indefinição sobre a voluntariedade da confissão extrajudicial”, disse.
Confissão deve ser avaliada em conjunto com outras provas O ministro ressaltou que é incorreto atribuir um valor probatório supremo à confissão, pois ela está frequentemente no centro de condenações injustas. Assim, segundo o magistrado, é necessário detalhar as regras de valoração racional para esclarecer o peso real da confissão e reduzir o risco de condenações de inocentes que tenham confessado falsamente.
Ribeiro Dantas afirmou que o CPP estabelece regras para a valoração da confissão nos artigos 197 e 200, os quais determinam que a confissão deve ser avaliada em conjunto com outras provas, cabendo ao juiz analisar se há compatibilidade entre elas. No entanto, o ministro apontou que esses artigos não especificam o nível de compatibilidade e harmonia necessário entre a confissão e as outras provas, deixando ao juiz a tarefa de utilizar critérios racionais para justificar suas conclusões sobre a prova.
O relator considerou importante haver um conjunto probatório robusto em julgamentos criminais, já que a inclusão de novas evidências pode enfraquecer ou até refutar a tese original da acusação.
“A jurisdição criminal justa precisa, pois, de uma investigação criminal eficiente, competente e profissional para que possa ser exercida, sob pena de se elevar o risco de condenações de pessoas inocentes – que, com as atuais práticas da polícia e do Ministério Público brasileiros, certamente é altíssimo. Isso é o que requer o próprio artigo 6º do CPP, quando institui para o delegado, entre outras, as obrigações funcionais de resguardar o corpo de delito (inciso II) e arrecadar ’todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato (inciso III)”, concluiu.
A Terceira Seção estabeleceu que as teses adotadas só deverão ser aplicadas aos fatos posteriores.
Leia o acórdão no AREsp 2.123.334.
Com base na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 506 da repercussão geral – que entendeu pela descriminalização do porte de droga para consumo pessoal (artigo 28 da Lei 11.343/2006) –, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a atipicidade da conduta e absolveu um réu com o qual foram apreendidos 23 gramas de maconha.
Em julgamento finalizado em junho deste ano, o STF considerou que não comete infração penal quem guarda ou transporta maconha para uso pessoal, que fica sujeito à apreensão da droga e à aplicação de sanções de caráter não penal, como advertência e comparecimento a programa educativo.
Ainda segundo o STF, será presumido usuário quem tiver consigo até 40 gramas de Cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional defina legislação sobre o tema.
No caso analisado pelo STJ, em razão da apreensão de maconha em sua casa, o réu foi condenado em primeiro grau a seis anos e nove meses de reclusão por tráfico (artigo 33 da Lei de Drogas). A defesa apelou e pediu a desclassificação do delito para posse para uso próprio, mas a sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR).
Conduta foi desclassificada pelo STJ para porte para consumo pessoal Em decisão monocrática, o relator do recurso no STJ, ministro Sebastião Reis Junior, já havia desclassificado a conduta do réu para a de uso de entorpecente para consumo pessoal, em razão do contexto dos autos e da pequena quantidade apreendida.
Contudo, em nova análise do caso, o ministro entendeu que o precedente firmado pelo STF exigia a modificação da situação do recorrente, tendo em vista a compatibilidade entre a hipótese dos autos e as teses estabelecidas em repercussão geral.
Ao extinguir a punibilidade pela atipicidade da conduta, o ministro determinou a remessa dos autos ao juizado especial criminal competente, para eventual aplicação de sanção administrativa.
Leia o acórdão no REsp 2.121.548.
A 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu provimento à apelação criminal contra a sentença que aplicou ao advogado de um homem penalidade de multa por supostamente o advogado ter abandonado o processo, infração prevista no antigo art. 265 do Código de Processo Penal (CPP).
O advogado argumentou que embora tenha apresentado as alegações finais com atraso, o fato não causou prejuízo ao processo. Ele pediu a anulação da multa e solicitou que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) fosse notificada para apurar a questão.
Consta nos autos que a multa foi aplicada porque o defensor não apresentou as alegações finais dentro do prazo, o que foi visto como abandono de causa.
Segundo a relatora da apelação, desembargadora federal Solange Salgado da Silva, de acordo com nova legislação, Lei 14.752/2023, que alterou o art. 265 do CPP, a multa por abandono de processo foi extinta, e as infrações éticas passaram a ser de responsabilidade exclusiva da OAB.
Ressaltou a magistrada que, “(…) desde a modificação legislativa trazida pela nova lei, foi excluída do CPP a previsão de responsabilização por multa do patrono que agir com desídia nos interesses do patrocinado, passando a apuração de infrações éticas no exercício da advocacia a ser de exclusiva responsabilidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)”.
O voto foi acompanhado pelo Colegiado.
Processo: 0000391-78.2014.4.01.3304
A 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 2ª Vara Criminal de Marília, proferida pelo juiz Paulo Gustavo Ferrari, que condenou homem pelos crimes de uso de documento falso, falsificação de documento público e falsidade ideológica, durante mais de 20 anos. A pena foi fixada em três anos e seis meses de reclusão, em regime inicial aberto.
De acordo com os autos, o réu foi preso após utilizar documento falso durante cumprimento de mandado de busca e apreensão. Na delegacia, verificou-se a verdadeira identidade do homem e apurou-se que o acusado usou a identidade falsa por mais de 20 anos, período em que manteve união estável e registrou um filho.
O relator do recurso, desembargador Ricardo Sale Júnior, destacou, em seu voto, que “as reprimendas foram bem fixadas pela sentença, em consonância com os critérios definidos em lei, em montante adequado para a reprovação e prevenção dos crimes cometidos pelo recorrente”.
Completaram o julgamento os desembargadores Gilda Alves Barbosa Diodatti e Bueno de Camargo. A votação foi unânime.
Apelação nº 1506765-45.2023.8.26.0344
Ao declarar a ilegalidade de provas obtidas por policiais que não utilizavam câmeras corporais no momento da abordagem, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforçou a necessidade do uso desses equipamentos como forma de resolver eventuais divergências entre as alegações dos agentes e as dos suspeitos.
Como consequência das contradições verificadas nos depoimentos, e diante da impossibilidade de confrontar os relatos com gravações audiovisuais, o colegiado aplicou o princípio in dubio pro reo e concedeu habeas corpus para absolver três pessoas acusadas de tráfico de drogas.
“Infelizmente, ainda não chegamos ao desejado cenário em que todos os policiais de todas as polícias do Brasil estejam equipados com bodycams em tempo integral, o que não apenas ajudaria a evitar desvios de conduta, mas também protegeria os bons policiais de acusações injustas de abuso, com qualificação da prova produzida em todos os casos”, afirmou o ministro Rogerio Schietti Cruz, relator.
O ministro lembrou que em 2022, no julgamento do RHC 158.580, a Sexta Turma, interpretando o artigo 244 do Código de Processo Penal, definiu que a realização de busca pessoal ou em veículo sem mandado judicial exige a demonstração de uma suspeita prévia, baseada em fatos concretos e descrita com a maior precisão possível, não bastando descrições genéricas ou informações de fonte não identificada, como denúncias anônimas. O mesmo entendimento vem sendo aplicado às buscas residenciais sem ordem judicial.
Mais recentemente, destacou, o STJ tem analisado não apenas se os elementos que a polícia tinha antes da diligência justificavam a medida, mas também se as afirmações dos agentes são suficientes, especialmente quando se trata de versões aparentemente inverossímeis, incoerentes ou contraditadas por alguma prova dos autos.
Segundo o ministro, fenômenos estudados nos EUA também acontecem no Brasil Citando estudos realizados nos Estados Unidos, Schietti comentou a identificação de fenômenos como o dropsy testimony, em que os policiais alegam em juízo que o suspeito, ao ser avistado, teria largado as drogas e fugido. Esse fenômeno – apontou o ministro – passou a ser visto como parte de um movimento mais amplo, conhecido como testilying – mistura dos verbos testify (testemunhar) e lying (mentindo), ou seja, a distorção dos fatos em juízo para tentar legitimar uma ação policial ilegal.
“O fenômeno do testilying não é estranho ao cenário brasileiro. Entre nós, é mais conhecido por ‘arredondar a ocorrência’, expressão consolidada no jargão policial e que consta até mesmo em dicionários de linguagem castrense, com o significado de ’tornar transparente uma situação embaraçosa’”, afirmou.
Nesse contexto é que, segundo o ministro, cresce a importância de corroboração do depoimento policial por outros elementos independentes, cujo “principal e mais confiável exemplo” é a filmagem por meio das câmeras corporais.
Segundo Schietti, enquanto não for atingido o cenário ideal em que todas as diligências sejam filmadas, para evitar distorções dos fatos, é necessário, no mínimo, um “especial escrutínio” sobre o depoimento policial, na forma proposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no RE 603.616.
“Trata-se, portanto, de abandonar a cômoda e antiga prática de atribuir caráter quase inquestionável a depoimentos prestados por testemunhas policiais, como se fossem absolutamente imunes à possibilidade de desviar-se da verdade; do contrário, deve-se submetê-los a cuidadosa análise de coerência – interna e externa –, verossimilhança e consonância com as demais provas dos autos”, disse.
Policiais descreveram a apreensão de drogas em três versões diferentes Em um dos casos analisados no julgamento (HC 831.416), Schietti comentou que os policiais descreveram a diligência que levou à apreensão de drogas de três maneiras bastante distintas e opostas à versão do suspeito, o que gerou dúvidas sobre a verdadeira dinâmica dos fatos.
O relator salientou que, como a ação policial não foi gravada, não foi possível dirimir as “relevantes dúvidas” existentes nos depoimentos quanto à dinâmica dos fatos – “as quais, uma vez que persistem, devem favorecer o acusado, em conformidade com antigo brocardo jurídico (in dubio pro reo)”.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
HC 768440
HC 831413
HC 831416
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao discutir a aplicação do Tema Repetitivo 1.114, esclareceu que a nulidade decorrente da inobservância do interrogatório do réu como último ato da fase de instrução pode ser suscitada até o momento das alegações finais, nos termos do artigo 571, incisos I e II, do Código de Processo Penal (CPP).
O colegiado afastou, assim, a interpretação de que, ao fixar a tese repetitiva, a seção de direito criminal teria definido que a nulidade deveria ser arguida no momento do interrogatório ou, no máximo, até a primeira oportunidade após a defesa ter ciência da inversão da ordem das oitivas.
No voto que prevaleceu na Terceira Seção, o ministro Sebastião Reis Junior comentou que a publicação do inteiro teor do julgamento do Tema 1.114 pode ter dado margem à conclusão de que teria ficado vencida a posição segundo a qual a nulidade relativa à ordem do interrogatório deve ser apontada até as alegações finais.
CPP prevê que nulidades da fase de instrução sejam apontadas até as alegações finais Na verdade – afirmou o ministro –, o entendimento unânime foi no sentido de que, se o CPP define que as nulidades da fase de instrução podem ser arguidas até as alegações finais, a mesma compreensão deve ser aplicada no caso de apontamento da defesa sobre a inversão indevida da ordem dos interrogatórios.
“Não obstante o equívoco verificado, é certo que o fato de o voto condutor ou mesmo a ementa sugerir algo distinto do que foi efetivamente decidido não altera o resultado do julgamento efetivamente proclamado, nem firma a necessidade de retificação do resultado, inclusive porque a tese estabelecida é bastante clara no sentido de que a nulidade pode ser suscitada até as alegações finais, na medida em que refere à disposição contida no artigo 571, I e II, do CPP”, concluiu.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): EAREsp 2400913
A 10ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve júri popular realizado na Comarca de Caraguatatuba que condenou homem por homicídio. A pena foi fixada em 31 anos, 6 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial fechado.
De acordo com os autos, o réu convidou a vítima para ir até sua casa para beberem. Após uma discussão, o acusado pegou uma faca e deu 50 golpes no amigo. O réu gravou as agressões e enviou para a ex-companheira. Após o crime, tentou ocultar o corpo da vítima no porta-malas de um carro.
Para a relatora do recurso, desembargadora Rachid Vaz de Almeida, a junção dos elementos e informações produzidas durante a persecução penal, referendaram, com absoluta suficiência, o juízo de convencimento condenatório. “Não houve a presença de nenhum indicativo, mais preciso e concreto, sobre a presença de terceira pessoa que seria responsável pelo crime, tese essa, aliás, devidamente afastada pelo Conselho de Sentença”, salientou a magistrada.
Os desembargadores Nuevo Campos e Nelson Fonseca Júnior completaram a turma de julgamento. A decisão foi unânime.
Apelação nº 1504502-20.2020.8.26.0126
Para a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a morte do réu denunciado por crime doloso contra a vida, antes da instauração do tribunal do júri, afasta a competência deste para julgar um corréu denunciado por crime conexo. Na avaliação do colegiado, essa é uma hipótese de exceção à regra da perpetuação da jurisdição.
Com esse entendimento, os ministros negaram provimento ao recurso de uma mulher que alegava incompetência do juízo que a condenou pelo crime de denunciação caluniosa. Segundo a defesa, a competência do tribunal do júri deveria ter sido mantida mesmo após a morte do companheiro da recorrente, o qual vinha sendo processado sob a acusação de tentar matar a própria filha.
De acordo com o Ministério Público do Rio de Janeiro, a mulher acusou um terceiro pela tentativa de homicídio, quando sabia que o seu então companheiro é que tinha sido o responsável por agredir a vítima, sua enteada. Posteriormente, ela admitiu ter feito uma acusação falsa.
Segundo a defesa, quando se decidiu que o processo deveria ser julgado pelo juízo singular, após a morte do companheiro denunciado pela tentativa de homicídio, não havia nenhuma das causas de modificação de competência previstas no artigo 81, parágrafo único, do Código de Processo Penal (CPP).
Exceção ao princípio da perpetuação de jurisdição O relator do recurso no STJ, ministro Sebastião Reis Junior, explicou que as hipóteses do parágrafo único do artigo 81 do CPP – impronúncia, absolvição sumária e desclassificação – são circunstâncias que afastam a competência do tribunal do júri antes de sua instauração, na medida em que são estabelecidas ainda na primeira fase do julgamento (juízo de acusação).
Citando doutrina sobre o assunto, o ministro observou que essa regra cria uma exceção ao princípio de perpetuação da jurisdição, de modo que, verificada qualquer daquelas circunstâncias ainda na primeira fase, é afastada a competência do júri popular para o julgamento do crime conexo ao crime contra a vida.
Para o ministro, o rol do artigo 81, parágrafo único, do CPP não pode ser tido como taxativo – ao contrário do que sustentou a defesa da recorrente.
“Se o corréu, a quem foi imputada a prática de crime contra a vida, falece ainda na primeira fase do procedimento, tal como ocorreu no caso dos autos, não há justificativa razoável para submeter o crime conexo (comum) a julgamento perante o tribunal popular, sendo certo que essa hipótese se assemelha àquelas previstas no dispositivo em comento, na medida em que afasta a competência do tribunal do júri ainda na fase do juízo de acusação”, ponderou.
Leia o acórdão no REsp 2.131.258.
Mesmo tendo havido consentimento inicial para o sexo, a simples discordância da vítima em prosseguir na relação – quando essa negativa não é respeitada pelo agressor – basta para a caracterização do crime de estupro. Não se exige, em tais casos, que a recusa seja drástica ou que a vítima tenha uma reação enérgica no sentido de interromper o ato sexual.
O entendimento foi adotado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, ao reformar acórdão de segundo grau e restabelecer sentença que condenou um homem a seis anos de reclusão por estupro.
Ao decidir pela absolvição, o tribunal local havia entendido que, embora a mulher tivesse se recusado a seguir no ato sexual inicialmente consentido, não ficou comprovado no processo que essa discordância se deu de forma mais enfática, a ponto de ser percebida efetivamente pelo réu.
“O dispositivo do Código Penal que tipifica o delito de estupro não exige determinado comportamento ou forma de resistência da vítima. Exige sim, implicitamente, o dissenso, o que restou comprovado nos autos”, afirmou o ministro Sebastião Reis Junior no julgamento.
Relação sexual deve ser consentida do início ao fim No voto acompanhado pela maioria do colegiado, o ministro comentou que, no crime de estupro, o constrangimento da vítima pode se dar por meio de violência ou grave ameaça (artigo 213 do Código Penal).
No caso dos autos, o magistrado apontou que, em seu depoimento judicial, a vítima afirmou ter dito ao réu que não desejava seguir na relação íntima, mas, mesmo após ouvir o “não”, ele seguiu no ato sexual mediante força física.
De acordo com Sebastião Reis Junior, a concordância e o desejo inicial têm que perdurar durante toda a relação, pois a liberdade sexual pressupõe a possibilidade de interrupção do ato. “O consentimento anteriormente dado não significa que a outra pessoa pode obrigá-la à continuidade do ato sexual. Se um dos parceiros decide interromper a relação sexual e o outro, com violência ou grave ameaça, obriga a desistente a continuar, haverá a configuração do estupro”, afirmou.
Contato posterior com agressor pode indicar mecanismo de redução de danos Segundo o ministro, o fato de a vítima não ter “reagido física ou ferozmente” à continuidade do ato sexual não afasta o estupro, pois houve manifestação clara de discordância por parte dela. Pela mesma razão, apontou, o crime não deixa de estar configurado porque a vítima, após a resistência inicial, finalmente se submeteu ao ato, apenas aguardando que terminasse.
“A (relativa) passividade, após a internalização de que a resistência ativa não será capaz de impedir o ato, não é, por diversos fatores, incomum em delitos dessa natureza”, declarou o ministro ao lembrar que, segundo o processo, passada a resistência inicial, a vítima percebeu que não teria forças para impedir o ato e apenas esperou “que a violência chegasse logo ao fim”.
Também no entendimento do ministro, a informação de que, após o crime, a vítima teria trocado mensagens com o agressor não é suficiente para descaracterizar o estupro, como chegou a apontar o tribunal local – em “viés desatualizado e machista da situação”, segundo Sebastião Reis Junior –, pois, além de permanecer a demonstração da recusa durante a relação, o contato posterior pode indicar que a vítima buscou mecanismos para diminuir o “peso errôneo da culpa”, ou mesmo para sobreviver física e mentalmente à violência à qual foi exposta.
“Se tal pensamento fosse a solução certeira para o caso, não se caracterizaria o delito de estupro quando mulheres são subjugadas, dentro do lar, por seus maridos e companheiros à violência sexual, porque, mesmo dissentindo claramente do ato, submetem-se de maneira passiva aos desejos sexuais do consorte por inúmeros e inimagináveis motivos, como dependência financeira, emocional, forma de criação, pela cultura patriarcal enraizada em nossa sociedade, que vê o homem como uma figura que deve ser servida, temida e obedecida a todo instante pela mulher”, concluiu o ministro.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
A ação penal no Brasil, em regra, é pública ou sigilosa? A resposta mais simples é citar o princípio da publicidade dos atos processuais, previsto no artigo 5º, inciso LX, da Constituição Federal, segundo o qual a restrição ao caráter público dos processos só é justificável para proteção da intimidade ou em prol do interesse social. Entretanto, o dia a dia forense mostra que, na verdade, existem tantas ações criminais em tramitação sob segredo de justiça que a exceção, às vezes, pode soar como regra.
Muitas explicações são possíveis para esse quadro, entre elas a amplitude de termos como “intimidade” ou “interesse social” – os requisitos constitucionais para que a ação seja tratada como sigilosa. É possível que o segredo processual tenha relação com o tipo de crime (em um processo sobre estupro, por exemplo, existe a preocupação de preservar a intimidade da vítima) ou com a necessidade de preservar informações protegidas constitucionalmente (resultantes, por exemplo, da quebra de sigilos bancário ou fiscal). Também há sigilo nas situações em que a publicidade pode colocar em risco a colheita de provas.
Entre a publicidade como regra e o segredo como exceção, está a Justiça, à qual incumbe avaliar a pertinência – ou não – de impor o sigilo nos autos. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se posicionou em diversas situações nas quais a restrição à publicidade em casos criminais era questionada – seja para mantê-la, seja para afastá-la.
Sigilo dos dados processuais não é direito absoluto dos envolvidos Conforme explicou o ministro Francisco Falcão na APn 1.057, além do artigo 5º, inciso LX, também o artigo 93, inciso IX, da Constituição impõe que todos os julgamentos do Judiciário sejam públicos, podendo haver limitação da publicidade para a prática de determinados atos, quando for necessário preservar a intimidade dos interessados, mas desde que não seja prejudicado o interesse público à informação.
“O sigilo, portanto, configura situação excepcional, razão pela qual o seu deferimento deve passar pelo crivo da ponderação dos princípios constitucionais, de acordo com as particularidades do caso concreto”, completou.
No caso dos autos, segundo o ministro, os réus apresentaram argumento genérico de que a decretação do sigilo seria necessária para a proteção da sua segurança e para que não tivessem “suas vidas publicamente devassadas” e as investigações não se tornassem “verdadeiras penas antecipadas”. Contudo, para o relator, esses argumentos não eram suficientes para afastar a regra da publicidade processual.
No mesmo sentido, em caso analisado pela Quinta Turma, o ministro Jorge Mussi (aposentado) apontou que, embora seja possível restringir a divulgação e o acesso a dados de processos em andamento, essa limitação é restrita às hipóteses nas quais a preservação da intimidade se sobreponha ao interesse público.
“O sigilo dos dados de um processo judicial não é direito subjetivo absoluto dos envolvidos. Ao contrário, interpretando-se a norma inserta no artigo 792 do Código de Processo Penal, chega-se à conclusão de que a regra, para os processos regidos por esse diploma, é a da publicidade dos atos, que só será restringida nas hipóteses em que o acesso irrestrito puder resultar em escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem”, afirmou.
Sessão do júri sobre crime sexual pode ser feita sem a presença de público O artigo 234-B do Código Penal estabelece que as ações relativas a crimes contra a dignidade sexual devem correr em segredo de justiça.
Na Sexta Turma, os ministros analisaram pedido do Ministério Público (MP) para que, em processo sobre homicídio, estupro de vulnerável e ocultação de cadáver, a sessão do tribunal do júri não fosse realizada sem a presença de público, conforme havia decidido o juízo de primeiro grau. Na visão do MP, o público deveria ser retirado do recinto apenas durante o depoimento de uma testemunha adolescente, também vítima de abusos, mantendo-se a publicidade do restante da sessão do júri.
A relatora, ministra Laurita Vaz (aposentada), destacou que, segundo o tribunal de segunda instância, o fato de a vítima ter morrido não afastava a necessidade da preservação de sua imagem e dignidade. Além disso, seria preciso tomar o depoimento da testemunha adolescente da forma menos traumática possível.
O segredo de justiça previsto no artigo 234-B do Código Penal deve se dar integralmente, estendendo-se ao processo como um todo, não prevendo distinção entre réu e vítima. Processo em segredo Ministra Laurita Vaz
De acordo com a ministra, o tribunal de origem se posicionou em consonância com a jurisprudência do STJ, “segundo a qual, conquanto o princípio constitucional da publicidade dos atos processuais seja a regra, este é passível de sofrer restrições para, tal qual no caso concreto, preservar o interesse público ou a integridade e a intimidade das partes”.
Identificação do nome do réu em ação penal não viola direito à intimidade Em processo sobre suposto crime de divulgação de pornografia infantil, a Quinta Turma analisou pedido do réu para que seu nome completo fosse retirado do sistema de informações da Justiça Federal (RMS 49.920).
Para o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator do recurso em mandado de segurança, ainda que a Resolução 121/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) autorize a restrição do acesso às informações processuais em ações sigilosas, a regra não pode se sobrepor ao princípio constitucional da publicidade.
A eventual decretação de uma exceção que justificaria a imposição de sigilo absoluto aos dados básicos de um processo judicial não constitui direito subjetivo da parte envolvida em processo que tramita sob segredo de justiça, demandando, ao contrário, uma avaliação particular que delimite o grau de sigilo aconselhável em cada caso concreto, avaliação essa devidamente fundamentada em decisão judicial. Processo em segredo Ministro Reynaldo Soares da Fonseca
Segundo o ministro, não configura violação à intimidade a identificação, pelo nome completo, de réu maior de idade em ação penal. “Vê-se, assim, que o interesse público em acompanhar a resposta estatal na repressão de crimes é, também, perfeitamente legítimo e se sobrepõe, como regra, ao direito do réu de proteger seu nome sob sigilo”, concluiu.
Questionamento sobre segredo deve ser feito no momento adequado Em habeas corpus julgado pela Sexta Turma em 2010 (HC 148.723), os ministros analisaram o pedido de nulidade de uma ação penal porque, segundo a defesa, ela teria tramitado indevidamente sob segredo de justiça. Para a defesa, o trâmite sigiloso do processo teria violado o direito do réu de ser processado e julgado publicamente. Assim – acrescentou –, não tendo sido observada a regra constitucional, a nulidade do processo seria absoluta e o prejuízo, presumido.
A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, afirmou que, em nenhuma das fases da ação penal, a defesa impugnou o seu processamento em segredo. Na apelação, por exemplo, a tese defensiva foi de absolvição e, alternativamente, de exclusão da agravante de reincidência.
A defesa só veio a suscitar a nulidade em habeas corpus ajuizado após o julgamento do recurso pelo tribunal de origem – o que, segundo a relatora, impõe o reconhecimento da preclusão da matéria.
O simples fato de o feito ter tramitado em sigilo, com a implícita concordância da defesa, não gera qualquer nulidade. Poderia se cogitar eventual vício em situação oposta, ou seja, se não tivesse sido observado o sigilo determinado por lei. HC 148.723 Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Adicionalmente, a ministra observou que, segundo informações do processo, o trâmite em sigilo não trouxe nenhum prejuízo à defesa, a qual teve acesso normal aos autos, não havendo alegação em sentido contrário.
Vítimas ou familiares podem acessar provas já documentadas no inquérito Mesmo que o inquérito policial esteja em sigilo para garantir a efetividade das investigações, a Sexta Turma considerou que a vítima ou seus familiares podem ter acesso aos elementos de prova que já foram colhidos e documentados.
O caso chegou ao STJ após as instâncias ordinárias negarem o pedido de acesso às provas do inquérito pelas vítimas, sob o argumento de que a autorização resultaria em acesso a dados sigilosos de terceiros, o que, na prática, acabaria por eliminar o segredo dos autos. O tribunal de origem ainda apontou que o artigo 20 do Código de Processo Penal, em exceção ao princípio da publicidade, prevê que a autoridade policial deve assegurar, no inquérito, o sigilo necessário à elucidação dos fatos.
Relator do recurso em mandado de segurança, o ministro Rogerio Schietti Cruz comentou que, embora a finalidade do sigilo seja proteger o inquérito de interferências externas e garantir a eficácia da investigação, a jurisprudência dos tribunais superiores entende que o segredo tem caráter relativo em relação às diligências finalizadas e documentadas na investigação.
“Compreende-se, em suma, que o sigilo do inquérito não pode ser evocado para obstaculizar direitos e garantias fundamentais”, completou.
Schietti também reforçou que, de acordo com a Súmula Vinculante 14, é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, documentados em procedimento investigatório, tenham relação com o exercício do direito de defesa.
Na mesma linha, em recurso em mandado de segurança julgado pela Quinta Turma (RMS 55.790), o ministro Jorge Mussi (aposentado) apontou que a decretação de sigilo, mesmo em caso de inquérito, depende da apresentação de razões fundamentadas que sustentem essa restrição, sob pena de inversão do princípio constitucional de ampla publicidade dos atos e das decisões administrativas e judiciais.
“Esse entendimento é o que melhor se coaduna com o modelo democrático adotado pelo constituinte de 1988, distanciando-se de sistemas inquisitoriais típicos de regimes autoritários, nos quais o investigado é mero objeto das ações de repressão do Estado”, apontou Mussi.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
APn 1057
RMS 49920
RMS 55790
HC 148723
Em caso de bloqueio universal dos bens do investigado, inexistindo indícios de fraude para estabelecer os honorários em montante fictício, há obrigatoriedade de se liberar o valor integral dos honorários advocatícios acordados entre as partes, desde que não ultrapassado o limite legal de 20% do patrimônio bloqueado.
Informações do Inteiro Teor A controvérsia cinge-se em definir se, em caso de bloqueio universal dos bens do investigado, há discricionariedade do magistrado para decidir o numerário a ser liberado dos valores constritos para fins de pagamento de honorários advocatícios; ou se, do contrário, há obrigatoriedade de se liberar o valor integral dos honorários acordados entre as partes, desde que não ultrapassado o limite legal de 20% do patrimônio bloqueado.
No caso, as instâncias ordinárias entenderam pela possibilidade de levantamento apenas parcial dos honorários advocatícios, sob a avaliação de que o momento embrionário das investigações não recomendaria a sua liberação integral, bem como sob a interpretação de que a expressão “até 20% dos bens bloqueados”, contida no art. 24-A da Lei n. 8.906/1994, dava ao magistrado margem de liberdade para decidir pela liberação de porcentagem inferior.
No entanto, tal compreensão reduz, em demasia, o espaço em que deveria imperar a autonomia privada das partes - contrato entre cliente e advogado -, dando ao magistrado o poder de definir o que seria ou não razoável e proporcional aos serviços prestados.
Destarte, se o contrato conformado entre as partes estipula que o pagamento dos honorários deve ser integralmente satisfeito ao início da persecução penal, não há falar que o fato de as investigações estarem em estágio preliminar afastaria a possibilidade de liberação dos honorários advocatícios, pois tal aspecto insere-se plenamente na esfera de decisão dos contratantes.
A importância do direito à defesa e da atividade da advocacia no Estado Democrático de Direito confere ao art. 24-A do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil - EAOB a interpretação que prestigia a relação - desde que, evidentemente, lícita e isenta de indícios de fraude - estabelecida entre o advogado e o seu cliente, em relação ao pagamento dos honorários advocatícios, seja em relação ao seu valor, seja em relação à sua forma (data de vencimento, parcelamento, entre outros aspectos).
A única limitação prevista pelo legislador é de que a liberação dos valores para esse propósito não pode superar o montante de 20% de todo o patrimônio bloqueado. Tal implica em dizer que os honorários advocatícios podem ser, naturalmente, inferiores a 20% dos valores constritos, sendo que, nessas hipóteses, o valor levantado há de ser integral, pois não atingido o teto legal. Se o valor dos honorários superar 20% do patrimônio universal bloqueado, a liberação encontrará limite nessa porcentagem, em face da necessidade de se também garantir, por intermédio dos bens constritos, a satisfação de interesses outros, como a reparação à vítima e à restituição dos bens ilicitamente obtidos.
Portanto, não cabe ao magistrado avaliar se o momento embrionário da persecução penal justifica o pagamento do valor integral dos honorários, se tal questão foi acertada em contrato entabulado entre os particulares.
Por fim, havendo indicativos concretos da ocorrência de fraude entre as partes, ou seja, possível articulação entre o cliente e o advogado para estabelecer honorários em montante fictício, como forma de contornar o bloqueio realizado sobre os bens, o magistrado poderá, de forma fundamentada, excepcionar o regramento legal e determinar o levantamento de valor inferior ao artificialmente estipulado.
Legislação
Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), art. 24-A
A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve a condenação de um homem por exercício ilegal de atividade privativa da advocacia em Sorocaba/SP, em ação civil pública movida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A Seção da OAB de São Paulo e a Subseção de Sorocaba sustentaram que, a pretexto de prestar serviços administrativos, o escritório atuava na captação de clientes para propor ações judiciais contra o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e a Caixa Econômica Federal (Caixa), com promessa de resultados. Segundo os magistrados, documentos confirmaram as práticas ilegais, entre as quais o envio de mala direta de forma indiscriminada, ato proibido a advogados. “Comprovado que a empresa tinha por finalidade única a prospecção de clientes e a prática indevida de atividades privativas da advocacia, correta a sentença ao determinar o seu encerramento”, afirmou o relator, desembargador federal Wilson Zauhy. Além do fechamento do escritório, a sentença condenatória da 1ª Vara Criminal da cidade determinou o pagamento de indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 200 mil. O homem recorreu ao Tribunal na tentativa de manter a atividade, alegando que realizava serviços administrativos. A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. Assim, foi mantida integralmente a decisão do primeiro grau. Apelação Cível 5007608-10.2021.4.03.6110 Assessoria de Comunicação Social do TRF3
A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve, em parte, sentença da 28ª Vara Criminal da Capital, proferida pela juíza Fernanda Galizia Noriega, que condenou falso curandeiro por estelionato contra idoso. A pena foi redimensionada para dois anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, mantida a reparação, referente aos danos morais sofridos pela vítima, no valor de R$ 7 mil. Segundo os autos, o réu e um comparsa não identificado avistaram o idoso na rua e ofereceram uma reza para melhorar a qualidade de vida dele e dos familiares, sem qualquer cobrança. Em seguida, induziram-no a sacar R$ 7 mil em dinheiro para uma espécie de ritual, sob o pretexto de aumentar a eficácia da oração. As cédulas foram enroladas em um pano branco e, sem que a vítima notasse, os criminosos as substituíram por outros papéis antes devolverem o embrulho, subtraindo todo o montante. O golpe só foi percebido mais tarde, pela filha do idoso.
Para o relator do recurso, desembargador Moreira da Silva, a autoria e materialidade do crime foram bem demonstradas pelas provas dos autos: cópia do comprovante do saque e reconhecimento do criminoso pela vítima e sua filha, bem como pela identificação do veículo utilizado pelo acusado. “Oportuno anotar, também, que o apelante já se viu condenado, em caráter definitivo, por crimes da mesma espécie, de tal modo que se mostra portador de maus antecedentes, o que não serve, por si só, como prova acerca do delito apurado nestes autos, mas presta-se para reforçar convicções”, ressaltou.
Completaram o julgamento os desembargadores Marcelo Gordo e Marcelo Semer. A decisão foi unânime. Apelação nº 0094884-12.2016.8.26.0050 Comunicação Social TJSP – BC (texto)
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido de salvo-conduto para que uma mulher, com mais de 30 semanas de gestação, pudesse realizar procedimento de interrupção da gravidez sem ficar sujeita a processo penal pelo crime de aborto. Durante a gestação, ela descobriu que o feto tem uma alteração genética denominada Síndrome de Edwards, além de cardiopatia grave.
De acordo com o relator, ministro Messod Azulay Neto, o caso não se equipara à situação dos fetos anencéfalos, cujo aborto não é considerado crime por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54.
O habeas corpus chegou ao STJ após a gestante ter seu pedido negado em primeira e segunda instâncias. Ela requeria que fosse aplicado ao seu caso, por analogia, o entendimento firmado pelo STF em relação aos fetos anencéfalos, e também alegava que o prosseguimento da gravidez traria risco à sua própria vida.
Inviabilidade da vida extrauterina foi a premissa do STF O ministro Messod Azulay Neto considerou que não é o caso de aplicação da interpretação do STF na ADPF 54, pois os laudos médicos juntados ao habeas corpus não indicavam a inviabilidade – diferentemente do que acontece com um anencéfalo. E o entendimento do STF, de acordo com o ministro, “parte da premissa da inviabilidade da vida extrauterina”.
“A anencefalia, doença congênita letal, pressupõe a ausência parcial ou total do cérebro, para a qual não há cura e tampouco possibilidade de desenvolvimento da massa encefálica em momento posterior. O crime de aborto atenta contra a vida, mas, na hipótese de anencefalia, o delito não se configura, pois o anencéfalo não tem potencialidade de vida. E, inexistindo potencialidade para o feto se tornar pessoa humana, não surge justificativa para a tutela jurídico-penal”, disse o relator.
“Embora o feto esteja acometido de condição genética com prognóstico grave, com alta probabilidade de letalidade, não se extrai da documentação médica a impossibilidade de vida fora do útero”, completou.
Legislar sobre o tema não é função do STJ Da mesma forma, Messod Azulay Neto enfatizou que não foi demonstrado o alegado risco à vida da gestante, fato que impede a aplicação da excludente de ilicitude prevista no artigo 128, inciso I, do Código Penal.
“Não quero menosprezar o sofrimento da paciente. Estou fazendo uma análise absolutamente técnica, considerando que o nosso ordenamento jurídico só autoriza a realização do aborto terapêutico e o resultante de estupro, além do caso particular analisado pelo STF, que é o de anencefalia”, explicou o ministro durante o julgamento.
Segundo ele, não cabe ao STJ legislar sobre o tema para criar hipóteses de aborto legal além daquelas previstas na lei ou no precedente do STF. “Eu estou aplicando puramente o direito”, declarou.
Leia o processo: HC 932495
É nulo o reconhecimento fotográfico realizado através da apresentação informal de foto via aplicativo de mensagens.
Informações do Inteiro Teor Como consabido, a apresentação de fotografia pelo método show up é ensejadora de erros de reconhecimento e até de contaminação da memória do depoente. A situação é agravada quando o mesmo acusado que realizou o reconhecimento informal o negou em juízo.
Sobre o tema, a Sexta Turma do STJ firmou recentemente novo entendimento de que o regramento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal é de observância obrigatória, e ainda assim não prescinde de corroboração por outros elementos indiciários submetidos ao crivo do contraditório na fase judicial.
Com tal entendimento, objetiva-se a mitigação de erros judiciários gravíssimos que, provavelmente, resultaram em diversas condenações lastreadas em acervo probatório frágil, como o mero reconhecimento fotográfico de pessoas em procedimentos crivados de vícios legais e até psicológicos - dado o enviesamento cognitivo causado pela apresentação irregular de fotografias escolhidas pelas forças policiais -, que acabam por contaminar a memória das vítimas, circunstância que reverbera até a fase judicial e torna inviável posterior convalidação em razão do viés de confirmação.
Nessa linha, a Sexta Turma desta Corte chegou ao consenso de que o prévio reconhecimento do réu por fotografia acaba por contaminar a memória da vítima, inviabilizando sua convalidação pelo posterior reconhecimento pessoal em juízo.
No caso, o reconhecimento foi realizado de forma absolutamente irregular, qual seja, apresentação informal de foto via aplicativo de mensagens a um dos acusados que, posteriormente, em juízo, negou as afirmações e foi absolvido das imputações de tráfico de drogas que lhe recaíam. Logo, tal prova é imprestável para utilização no feito, bem como as dela decorrentes, por aplicação do princípio da árvore dos frutos envenenados.
Por fim, a acusação não logrou êxito em demonstrar que os valores recolhidos na residência do réu seriam oriundos da atividade ilícita, ao contrário, inverteram o ônus da prova ao acusado para que comprovasse a origem lícita dos recursos, em afronta ao princípio acusatório no sistema processual penal brasileiro, que é mitigado tão somente em casos excepcionais, quando da apreensão com o réu de bens comprovadamente ilícitos, como no caso da receptação.
Legislação
Código de Processo Penal (CPP), art. 226
É possível o reconhecimento da atipicidade de conduta que poderia configurar o crime de estupro de vulnerável, quando as circunstâncias fáticas verificadas (consentimento da família da vítima, inclusive abrigando o casal por período de tempo, e a manutenção do relacionamento até os dias atuais, inclusive com nascimento de filho fruto da relação), indicam que o bem jurídico tutelado não foi vulnerado.
Informações do Inteiro Teor Não se ignora que a norma do art. 217-A do Código Penal objetiva tutelar não só a dignidade sexual da vítima, mas também o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes (REsp 1.480.881/PI, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, DJe 10/9/2015).
No entanto, o contexto que precedeu a prática delitiva (consentimento da família da vítima, inclusive abrigando o casal por período de tempo) e as circunstâncias fáticas verificadas durante a conduta (manutenção do relacionamento até os dias atuais, inclusive com notícia de filho fruto da relação), indicam que o bem jurídico tutelado não foi vulnerado.
Ainda que se pudesse argumentar que a vítima teve seu desenvolvimento afetado por ter sido submetida precocemente a obrigações típicas da idade adulta, essa assertiva não vence as circunstâncias concretas verificadas no caso, que indicam o contrário, sobretudo o fato de que o relacionamento entre ambos permaneceu, mesmo após a intervenção policial e judicial (ação penal), tendo, inclusive, se aprofundado com a concepção de um filho e planos de casamento.
Não parece adequado, diante do contexto atual, lançar argumentos vagos e especulativos no sentido de traçar um cenário ideal de desenvolvimento para vítima caso não tivesse sido inserida na vida sexual de forma precoce. O cenário fático parece inconteste: não há nenhum elemento concreto que indique lesão à dignidade sexual ou ao desenvolvimento da vítima. Ao revés, divisa-se a possibilidade de prejuízo concreto caso se opte pela via da intervenção estatal mediante aplicação da lei penal.
Há risco de taxar um relacionamento consolidado pelo tempo e pela formação de uma família, inclusive com prole, em criminoso, circunstância que põe em perigo a unidade familiar e a proteção de um terceiro inocente (filho). E, nesse aspecto, se de um lado a proteção à criança e ao adolescente tem sede constitucional (art. 227 da CF); do outro, a unidade familiar também goza de reconhecimento e proteção da Carta Magna (art. 226 da CF), de modo que não parece justo, sacrificar um em detrimento do outro.
Por fim, ressalte-se que não se está propondo a mitigação do Tema 918/STJ, mas apenas reconhecendo que a situação verificada é demasiadamente complexa, de modo que escapa da diretriz estabelecida no julgamento do REsp 1.480.881/PI.
Legislação
Constituição Federal (CF), art. 226 e art. 227.
Código Penal (CP), art. 217-A.
Precedentes Qualificados
Tema Repetitivo 918/STJ
Não é possível a concessão de salvo-conduto autorizando a realização de procedimento de interrupção da gravidez, em aplicação, por analogia, do entendimento firmado no julgamento da ADPF n. 54/STF, quando, embora o feto esteja acometido de condição genética com prognóstico grave (Síndrome de Edwards e cardiopatia grave), com alta probabilidade de letalidade, não for possível extrair da documentação médica a impossibilidade de vida fora do útero.
Informações do Inteiro Teor Em sede de arguição de descumprimento de preceito fundamental, ajuizada com o objetivo de que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo não fosse considerada crime, o Supremo Tribunal Federal conferiu interpretação conforme à Constituição, fixando o entendimento no sentido de que “Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.” (ADPF n. 54, Tribunal Pleno, Rel. Ministro Marco Aurélio, DJe 30.4.2013).
No voto condutor, o Ministro Marco Aurélio consignou que não se discutia a descriminalização do aborto, mas tão somente a possibilidade de interrupção da gravidez de feto anencéfalo. A anencefalia, doença congênita letal, pressupõe a ausência parcial ou total do cérebro para a qual não há cura e tampouco possibilidade de desenvolvimento da massa encefálica em momento posterior. O crime de aborto atenta contra a vida, mas, na hipótese de anencefalia, o delito não se configura, pois o anencéfalo não tem potencialidade de vida. E, inexistindo potencialidade para o feto se tornar pessoa humana, não surge justificativa para a tutela jurídico-penal.
O Ministro Marco Aurélio registrou, ainda, que “o feto anencéfalo, mesmo que biologicamente vivo, porque feito de células e tecidos vivos, é juridicamente morto, não gozando de proteção jurídica e (…) principalmente de proteção jurídico-penal. Nesse contexto, a interrupção da gestação de feto anencefálico não configura crime contra a vida - revela-se conduta atípica.” Assim, a interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal parte da premissa da inviabilidade da vida extrauterina.
Assentada a premissa teórica, impossível a aplicação do entendimento ao caso em análise, porquanto, embora o feto esteja acometido de condição genética com prognóstico grave, com alta probabilidade de letalidade, não se extrai da documentação médica a impossibilidade de vida fora do útero. Portanto, inviável a aplicação, por analogia, da interpretação conforme a Constituição fixada pela ADPF n. 54 do STF.
Ademais, no caso, não se identifica elementos objetivos que indiquem o risco no prosseguimento da gravidez para a gestante, o que, em tese, poderia levar à caracterização da excludente do art. 128, inciso I, do Código Penal.
Legislação
Código Penal (CP), art. 124, art. 126 e art. 128, incisos I e II
Precedentes Qualificados
ADPF n. 54 do Supremo Tribunal Federal
A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou, pelo crime de resistência, uma mulher que reagiu de forma hostil contra funcionários ao ser proibida de embarcar em voo transportando duas garrafas de bebida alcoólica. Ela foi abordada no raio-X da área internacional do Aeroporto de Guarulhos. O Tribunal manteve ainda as condenações da passageira por desacato a funcionário público e lesão corporal, impostas pela 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP. Conforme a denúncia, a mulher quebrou propositalmente as garrafas, batendo uma contra a outra. Ela também xingou os funcionários que operavam o equipamento de raio-X, quando foi informada que não poderia transportar o produto, criando tumulto na fila de embarque. Em seguida, policiais federais a informaram que ela não prosseguiria a viagem, devendo retornar ao aeroporto de origem, no Chile, já que a legislação brasileira autoriza recusar o trânsito a passageiros que causem transtornos. A mulher, então, negou-se a acompanhá-los até a Delegacia da Polícia Federal, precisando ser algemada. Consta ainda que ela mordeu o braço de uma policial federal, provocando ruptura da derme e hemorragia. A passageira contestou a acusação, dizendo ter ficado nervosa por não compreender bem a língua portuguesa e, assim, não entender o que os funcionários do aeroporto e policiais falavam. Afirmou desconhecer a regra brasileira que limita a 100 ml o transporte de qualquer tipo de bebida em voo internacional e alegou que apenas depositou as garrafas numa lixeira profunda, o que teria resultado na quebra acidental. O Ministério Público Federal (MPF) recorreu ao Tribunal pleiteando a condenação também pelo crime de resistência, uma vez que a sentença de primeiro grau considerou que o delito não ficou caracterizado. “Não há que se falar em absorção do delito de resistência pelo desacato, uma vez que as condutas ocorreram em momentos distintos, ora junto ao equipamento de raio-X, ora no percurso até a delegacia, que, segundo a testemunha, ficava em local mais afastado, dentro do aeroporto”, afirmou o relator, desembargador federal Ali Mazloum. “De início, a acusada desacatou os operadores do raio-X ao ser informada da impossibilidade da manutenção das garrafas que transportava em sua bagagem e, na sequência, empregou resistência contra o ato legal dos policiais federais que necessitaram contê-la e retirá-la do local de trânsito para embarque internacional, e assim evitar prejuízos aos demais passageiros que ali estavam.” Assim, a Quinta Turma, por unanimidade, proveu em parte o recurso do MPF para reformar a sentença e condenar a acusada por resistência, à pena de dois meses e 20 dias de detenção, em regime aberto, substituída por uma pena restritiva de direitos de prestação pecuniária no valor de um salário mínimo. O colegiado também manteve a condenação da mulher pelos crimes de lesão corporal e desacato, em concurso material, com o delito de resistência, à pena de multa no valor total de 58 dias-multa, cada qual no seu valor mínimo legal. Apelação Criminal 0002534-14.2013.4.03.6119 Assessoria de Comunicação Social do TRF3
Para manter a ordem pública, a 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou o pedido de um réu, preso em flagrante contrabandeando cigarros, para responder ao processo em liberdade.
Uma equipe da Polícia Rodoviária Federal (PRF), ao abordar o acusado que trafegava na BR-452, na altura do município de Rio Verde/GO, localizou no interior do veículo do indiciado mais de 25 mil maços de cigarros de origem estrangeira.
O relator, desembargador federal Marcus Vinícius Reis Bastos, ao analisar o caso, entendeu que o réu deve continuar em prisão preventiva estabelecida pelo Juízo Federal da Subseção Judiciária de Rio Verde/GO.
Ao justificar seu entendimento, o magistrado destacou que o “fato de que o Paciente fora definitivamente condenado, por duas vezes, pelo cometimento do crime de contrabando de cigarros, aliado à circunstância de que possui outra condenação, ora pendente de exame em sede recursal, pelo cometimento de delito da mesma natureza, indica contumácia no cometimento de ilícitos penais. Sua prisão preventiva, portanto, constitui medida necessária à garantia da ordem pública, vale dizer, trata-se de providência destinada a impedir a prática de novos crimes”.
A decisão do Colegiado foi unânime acompanhando o voto do relator.
Processo: 1012453-05.2024.4.01.0000
Data da publicação: 24/07/2024
LC/ML
Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
A 12ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve júri popular que condenou homem pelos crimes de feminicídio e aborto provocado por terceiro, cometidos contra a companheira grávida. A pena foi fixada em 11 anos de reclusão, em regime inicial fechado, nos termos da sentença da Vara do Júri de Americana, assinada pela juíza Roberta Virginio dos Santos.
Segundo os autos, réu e vítima viviam um relacionamento conturbado. Em determinada ocasião, após consumirem bebidas alcoólicas, o acusado golpeou a companheira com uma faca, ocasionado a morte dela e o aborto do bebê que ela gestava há seis meses. O homem chegou a alegar a que mulher teria cometido suicídio, mas a hipótese foi afastada por laudo pericial.
De acordo com o relator do recurso, desembargador Nogueira Nascimento, não é possível acolher qualquer das teses defensivas que alegaram nulidade do julgamento. “Quanto ao mérito, acolheu o Conselho de Sentença uma das teses apresentadas em plenário e com apoio na prova produzida durante o contraditório. Por este fundamento de mérito, dois julgamentos foram realizados, o último teve desfecho desfavorável ao apelante, na medida em que sobreveio a condenação pela prática do crime de feminicídio e também o de aborto praticado sem o consentimento da gestante”, apontou o magistrado, ao declarar a impossibilidade de submeter o réu a um terceiro julgamento, conforme limitação fixada pelo Código de Processo Penal.
Completaram o julgamento os desembargadores Paulo Rossi e Vico Mañas. A votação foi unânime. Apelação nº 1508410-47.2022.8.26.0019
Tema 506 - Tipicidade do porte de droga para consumo pessoal.
Há Repercussão? Sim
Relator(a): MIN. GILMAR MENDES
Leading Case: RE 635659
Descrição: Recurso extraordinário, em que se discute, à luz do art. 5º, X, da Constituição Federal, a compatibilidade, ou não, do art. 28 da Lei 11.343/2006, que tipifica o porte de drogas para consumo pessoal, com os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada.
Tese: Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III);
As sanções estabelecidas nos incisos I e III do art. 28 da Lei 11.343/06 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta;
Em se tratando da posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em Juízo, na forma do regulamento a ser aprovado pelo CNJ. Até que o CNJ delibere a respeito, a competência para julgar as condutas do art. 28 da Lei 11.343/06 será dos Juizados Especiais Criminais, segundo a sistemática atual, vedada a atribuição de quaisquer efeitos penais para a sentença;
Nos termos do § 2º do artigo 28 da Lei 11.343/2006, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito;
A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes;
Nesses casos, caberá ao Delegado de Polícia consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa minudente para afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários;
Na hipótese de prisão por quantidades inferiores à fixada no item 4, deverá o juiz, na audiência de custódia, avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio;
A apreensão de quantidades superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário.
A 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve condenação de cuidador de idoso por tentativa de latrocínio e extorsão. As penas foram redimensionadas para 13 anos, 6 meses e 19 dias de reclusão, em regime inicial fechado. A vítima, idosa com 79 anos, contratou o auxiliar de enfermagem para ajudá-la a cuidar do marido, diagnosticado com Alzheimer. Em determinado momento, notou o desaparecimento de dinheiro e, desconfiada do acusado, decidiu demiti-lo. Dias depois, o homem retornou à residência para supostamente buscar um calçado e tentou matá-la com uma faca e um martelo. Acreditando que o crime havia sido consumado, pegou a carteira da vítima e fugiu. Após duas semanas, passou a ameaçá-la de morte, solicitando valores entre R$ 25 mil e R$ 50 mil. Em seu voto, o relator do recurso, Marcos Alexandre Coelho Zilli, destacou que o réu premeditou a ação e utilizou de violência para possibilitar a subtração patrimonial. “O fato de o delito ter sido cometido na residência da ofendida é revelador de uma maior reprovabilidade. Com efeito, goza o domicílio de especial proteção constitucional – tratando-se de asilo inviolável – por constituir-se em espaço dedicado à convivência do indivíduo e de sua família, além de tratar-se de ambiente onde pode desenvolver a sua intimidade. Assim, a ação do acusado revela maior audácia, inserindo-se no âmbito das circunstâncias do crime como especial aspecto indicativo de maior reprovabilidade”, afirmou. Completaram o julgamento os desembargadores Guilherme de Souza Nucci e Leme Garcia. A decisão foi unânime. Apelação nº 1521971-45.2022.8.26.0050
A Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal 3ª Região (TRF3) manteve decisão que decretou a quebra de sigilo telemático e determinou a Google Brasil Internet Ltda o fornecimento de dados destinados a investigação criminal para apurar a prática de racismo durante a transmissão de um programa na internet.
Para os magistrados, a atividade de comunicação investigada ocorreu em território nacional, devendo se submeter à disciplina da jurisdição brasileira, segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio TRF3.
A 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo/SP havia determinado à empresa Google que fornecesse os dados cadastrais para apuração criminal, assim como o endereço IP vinculado a um usuário da plataforma “Twitch” que, no dia 26 de janeiro de 2021, teria proferido comentários racistas durante transmissão do programa “Marca Página”, então disponibilizado pelo canal “Omelete”.
A “big tech” norte-americana e suas filiais brasileira e europeia entraram com mandado de segurança no TRF3 e requereram a anulação da decisão de primeiro grau. Sustentaram que o endereço eletrônico requisitado era acessado no Espaço Econômico Europeu (EEE), sob a custódia de dados da Google Ireland, constituída segundo as leis irlandesas e sujeita ao Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da União Europeia. Alegaram ainda que houve equívoco quanto à adoção da premissa de que o Marco Civil da Internet autorizaria a requisição direta de dados.
Em decisão monocrática, o relator do processo, desembargador federal Hélio Nogueira, havia indeferido o pedido de tutela de urgência mantendo as impetrantes obrigadas a executar a quebra de sigilo telemático e a pagar multa diária de R$ 5 mil na hipótese de descumprimento. Ao analisar o recurso, o colegiado manteve a decisão monocrática. “O Brasil possui jurisdição sobre fatos relacionados a comunicações eletrônicas cujos registros tenham sido objeto de coleta, armazenamento, guarda ou tratamento em território nacional, não sendo admissível que a mera opção empresarial de transferir o armazenamento de dados para Estados estrangeiros, com legislações mais protetivas, constitua fundamento suficiente a amparar a recusa em atender a ordens judiciais brasileiras”, destacou o relator. O magistrado ressaltou entendimento do STF no sentido de que a cooperação jurídica internacional não constitui via exclusiva para obtenção de dados eletrônicos armazenados em Estado estrangeiro quando há vínculos das informações com o Brasil.
“O Supremo declarou também a constitucionalidade da requisição direta de dados de provedores de aplicações de internet sediados no exterior, por parte do Judiciário brasileiro, com base no artigo 11 do Marco Civil da Internet e no artigo 18 da Convenção de Budapeste sobre Crime Cibernético, por força dos princípios da soberania e da independência nacional”, disse.
Por fim, o colegiado considerou legal a aplicação de multa por descumprimento da decisão judicial que determinou a quebra de sigilo de dados telemáticos necessários ao esclarecimento da investigação criminal, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. “Mostra-se cabível a imposição de multa cominatória, com fulcro nos artigos 536, parágrafo 1º, e 537, ambos do Código de Processo Civil, cujas normas são subsidiariamente aplicáveis ao processo penal, por força do disposto no artigo 3º do Código de Processo Penal”, concluiu. Assim, a Décima Primeira Turma negou a concessão do mandado de segurança e julgou prejudicado o agravo interno. O caso No dia 26 de janeiro de 2021, um usuário da plataforma “Twitch”, serviço de transmissão ao vivo interativo para conteúdos de entretenimento, identificado como “abacate12345qaw”, teria proferido comentários racistas durante transmissão do programa “Marca Página”, então disponibilizado pelo canal “Omelete”. As suas declarações teriam sido expostas no espaço destinado ao “chat” dos usuários. No decorrer das investigações, foram prestadas informações cadastrais pela “Amazon Web Services” e “Amazon Serviços de Varejo do Brasil”, do grupo proprietário da plataforma “Twitch”, por meio das quais foi possível apurar que o IP utilizado para conexão pelo referido usuário seria proveniente de Lisboa (Portugal), bem como identificar o e-mail utilizado para cadastro na plataforma. Foi então determinado à empresa Google que fornecesse os dados cadastrais do usuário, assim como o IP vinculado à sua criação e os IPs vinculados ao último acesso à respectiva conta, tendo em vista que o investigado teria utilizado as credenciais da sua conta Google para ingressar na transmissão ao vivo realizada no Brasil. A Justiça Federal de São Paulo concluiu que a atividade de comunicação investigada ocorreu em território nacional, estando sujeita à jurisdição brasileira. Mandado de Segurança Criminal 5033520-35.2023.4.03.0000 Assessoria de Comunicação Social do TRF3
Crime de negligenciar, sem justificativa, a educação básica de filho em idade escolar.
Constituição Federal de 1988 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.
Família, criança, adolescente, jovem e idoso Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
Decreto-Lei nº 2.848/1940 Código Penal.
Crimes contra a assistência familiar Abandono intelectual
Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
Crime militar que ocorre quando um militar, sem autorização superior, deixa seu posto ou local de serviço designado, ou abandona o serviço que lhe foi atribuído.
Decreto-Lei nº 1.001/1969 Código Penal Militar.
Abandono de posto e outros crimes em serviço Abandono de pôsto
Art. 195. Abandonar, sem ordem superior, o pôsto ou lugar de serviço que lhe tenha sido designado, ou o serviço que lhe cumpria, antes de terminá-lo:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
Crime cometido por servidor público que deixa injustificadamente de exercer suas funções por mais de 30 dias consecutivos, podendo resultar em detenção e multa. Se resultar em prejuízo público ou ocorrer em zona de fronteira, a pena é agravada.
Decreto-Lei nº 2.848/1940 Código Penal.
Crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral Abandono de função
Art. 323 - Abandonar cargo público, fora dos casos permitidos em lei:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.
§ 1º - Se do fato resulta prejuízo público:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 2º - Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
Lei nº 8.112/1990 Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.
Penalidades Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:
II - abandono de cargo;
Habeas corpus. Crime de tráfico internacional de drogas. Ilegalidade acerca do laudo produzido utilizando-se de material produzido no exercício de auto defesa do paciente. Inexistência. Ampla dilação probatória. Inviabilidade. Distinção que não se aplica ao caso concreto. Pedido de extensão dos efeitos de decisão em habeas corpus de outro paciente. Prejudicialidade. Ordem denegada. O direito ao silêncio é reconhecido pela Constituição Federal (art. 5º, XLIII) e pelo Código de Processo Penal (art. 186). Infere-se das referidas normas que o acusado possui o direito de permanecer em silêncio ou de não se autoincriminar, sendo que, por ocasião do seu interrogatório, seja ele realizado durante a instrução processual ou até mesmo extrajudicial, poderá se calar acerca dos fatos criminosos supostamente imputados, assim como negar a autoria delitiva, sem ensejar apenação criminal ou mesmo valoração negativa das declarações postas em juízo, que poderá apenas desconsiderá-las no momento de valoração com os demais elementos de provas juntadas aos autos. As provas produzidas pelo próprio acusado e/ou investigado, desde que cientificado do seu direito ao silêncio, podem ser utilizadas contra si, não havendo necessidade de concordância expressa do acusado com o uso do seu padrão de voz para fins de identificação do possível autor do delito, inexistindo, portanto, violação ao direito a não autoincriminação. Embora a tese da impetração esteja amparada em precedente do STJ, referido acórdão foi reformado pelo STF, conforme esclarecido no voto-condutor. No caso, segundo consta das informações prestadas pela autoridade impetrada, o paciente foi expressamente cientificado do direito ao silêncio e ao de não autoincriminação e, livre de qualquer coação ou pressão, decidiu continuar o interrogatório policial, respondendo às perguntas do delegado de polícia, não havendo nulidade a ser declarada neste writ. Unânime. (HC 1012411-53.2024.4.01.0000 – PJe, rel. des. federal César Jatahy, em 23/07/2024.)
Homicídio culposo na direção de veículo automotor. Art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro. Laudo pericial. Validade. Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Responsabilidade ou participação da vítima. Ausência de exclusão da responsabilidade penal do acusado. Suspensão temporária para dirigir veículo automotor. Constitucionalidade. O STJ firmou o entendimento de que “no crime de homicídio culposo ocorrido em acidente de veículo automotor, a culpa concorrente ou o incremento do risco provocado pela vítima não exclui a responsabilidade penal do acusado, pois, na esfera penal não há compensação de culpas entre agente e vítima”. Ademais, o STF, no julgamento do RE 607.107/MG, com repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É constitucional a imposição da pena de suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor ao motorista profissional condenado por homicídio culposo no trânsito” (Tema 486). Unânime. (Ap 0005632-52.2013.4.01.3600 – PJe, rel. des. federal Marcos Augusto de Sousa, em 23/07/2024.)
Ato de deixar um animal doméstico ou domesticado em propriedade alheia sem o consentimento do proprietário, resultando em prejuízo.
Decreto-Lei nº 2.848/1940 Código Penal.
Dano Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia
Art. 164 - Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde que o fato resulte prejuízo:
Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, ou multa.
Habeas corpus. Crime previsto no art. 155, § 4º, III e IV, combinado com o art. 14, II, combinado com o art. 29, todos do Código Penal. Revogação de medida cautelar de monitoramento eletrônico. Possibilidade. Decurso de tempo. Constrangimento ilegal. Manutenção de outras medidas. A presente ordem de habeas corpus visa revogar medida cautelar – uso de monitoramento eletrônico – determinada pela autoridade impetrada, que perdura por mais de 11 meses, sem revisão periódica. No caso, o delito imputado não ostenta violência ou grave ameaça e inexiste qualquer evidência de que os pacientes não estejam colaborando com a justiça. No atual momento fático-processual, a medida de monitoramento eletrônico é inócua, pois se infere dos autos que os equipamentos não estão em pleno funcionamento, limitando-se a constranger os pacientes e a gerar, para o Estado, despesas desnecessárias de manutenção. Com efeito:“A manutenção dos pacientes com o monitoramento eletrônico, por prazo indeterminado e sem revisões periódicas, configura constrangimento ilegal e excesso de prazo, haja vista que assim como a segregação cautelar, a manutenção das cautelares alternativas não pode ocorrer de forma indefinida, de modo a transmudar-se em sanção penal sem sentença condenatória, razão pela qual o momento se mostra adequado para realizar a flexibilização de tal medida, pois, não só em se tratando de prisão preventiva, mas de qualquer medida cautelar, deve ser observado o princípio da provisoriedade.”. Precedente do STJ. Unânime. (HC 1014769-88.2024.4.01.0000 – PJe, rel. des. federal Maria do Carmo Cardoso, em sessão virtual realizada no período de 09 a 22/07/2024.)
Contrabando de cigarros. Ilicitude das provas obtidas. Busca pessoal sem fundada suspeita. Parecer do MPF pela absolvição do réu. O art. 244 do CPP não autoriza buscas pessoais praticadas como “rotina” ou “praxe” do policiamento ostensivo, com finalidade preventiva e motivação exploratória, mas apenas buscas pessoais com finalidade probatória e motivação correlata. No caso concreto, manifesta a ilegalidade da busca pessoal realizada por policiais rodoviários federais, após denúncia anônima – cuja existência sequer foi comprovada. Não foi apontada nenhuma atitude concreta da parte, que pudesse gerar suspeita de que ele trazia mercadoria ilícita, o que está em desacordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, o fato de terem sido encontrados objetos ilícitos – cigarros eletrônicos do Paraguai – após a revista, não convalida a ilegalidade prévia, pois é necessário que o elemento, fundada suspeita de posse de corpo de delito, seja aferido com base no que se tinha antes da diligência, ou seja, se não existia fundada suspeita de que a parte ré estava na posse dos referidos cigarros de origem estrangeira, não há como se admitir que a mera descoberta casual de situação de flagrância, posterior à revista do indivíduo, justifique a medida. Ademais, cumpre ressaltar que a ilegalidade da prisão em flagrante contamina a prova colhida, esvaziando da denúncia os indícios de materialidade e autoria, justificando, por conseguinte, a imediata interrupção da atividade persecutória estatal. Mesmo que a idoneidade da prisão em flagrante não tenha sido debatida pelo Juízo a quo, impõe-se a sua revogação, como consectário lógico, da declaração de nulidade da busca pessoal realizada, que fulminou todas as provas da materialidade delitiva, ensejando a absolvição da parte. Unânime. (Ap 1000065-22.2020.4.01.4103 – PJe, rel. des. federal Wilson Alves de Souza, em sessão virtual realizada no período de 09 a 22/07/2024.)
Habeas corpus. Desvio de verbas do Sistema Único de Saúde - SUS. Competência para processar e julgar a ação penal. Interesse da União caracterizado. Competência da Justiça Federal. Art. 109, IV, da CRFB. O Supremo Tribunal Federal possui entendimento no sentido de que a Justiça Federal é competente para processar e julgar ações penais relativas a desvio de verbas do Sistema Único de Saúde, já que o fato de a verba repassada ser proveniente de recursos federais fiscalizáveis pelo TCU basta para afirmar a existência de interesse da União. Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça possui julgados afirmando que as verbas repassadas pelo Sistema Único de Saúde, inclusive na modalidade de transferência “fundo a fundo”, ostentam interesse da União em sua aplicação e destinação, de modo que eventual desvio atrai a competência da Justiça Federal para conhecer da matéria, nos termos do art. 109, IV, da Constituição Federal, sendo irrelevante que a verba já tenha sido incorporada ao patrimônio estadual ou municipal. Unânime. (HC 1015086-86.2024.4.01.0000 – PJe, rel. des. federal Daniele Maranhão, em sessão virtual realizada no período de 08 a 19/07/2024.)
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