Pensão por morte deve ser fixada conforme lei vigente no momento do óbito, decide TJSP

A 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou o pagamento de pensão por morte a homem conforme legislação vigente no momento do falecimento da esposa. De acordo com os autos, a cônjuge do autor faleceu às 3h do dia 7/3/20. No momento, estava vigente a Lei Complementar Estadual (LCE) nº 180/78, na redação dada pela LCE nº 1.012/17. Poucas horas depois, às 6h58, foi publicada no Diário Oficial a Lei Complementar nº 1.354/20, que alterou artigos da LCE nº 180/78 e passou a ser desfavorável ao pleito do apelante. Para o relator designado, desembargador Paulo Barcellos Gatti, não há dúvidas quanto à necessidade de aplicação da norma previdenciária vigente na data da morte do contribuinte. “Ocorre que havendo imprecisões quanto ao fato que ocorreu primeiro, de rigor verificar o horário do evento. Assim, consigne-se que no momento da morte da contribuinte ainda não estava vigente a LCE nº1.354/20, não havendo amparo jurídico para aplicá-la”, escreveu o magistrado. Completaram a turma julgadora os desembargadores Ricardo Feitosa, Osvaldo Magalhães, Ana Liarte e Maurício Fiorito. A decisão foi por maioria de votos. Apelação nº 1005056-66.2022.8.26.0053

Passageiros que perderam sepultamento de familiar por serem impedidos de embarcar serão indenizados

A 17ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou uma companhia aérea a indenizar dois passageiros (pai e filho), que perderam o sepultamento de familiar após serem impedidos de embarcar em voo. A reparação por danos morais foi majorada de R$ 5 mil para R$ 10 mil para cada autor. A companhia alegou que a compra das passagens ocorreu com cartão de crédito de terceiro, razão pela qual impediu o embarque dos autores. Diante da impossibilidade de adquirir novos bilhetes, os autores não puderam viajar. O relator do recurso, desembargador Afonso Braz, destacou o caráter pedagógico da reparação de danos morais, justificando a majoração do valor para garantir “satisfatória compensação para o sofrimento moral experimentado pelos autores, que não puderam comparecer ao sepultamento de seu pai e avô” e “inibi-la na reiteração do ato”. Completaram o julgamento os desembargadores Luís H. B. Franzé e Eduardo Velho. A decisão foi unânime. Apelação nº 1042623-56.2023.8.26.0002

Prazo para exigir que infrator ambiental entregue bem apreendido conta da data de sua recusa

​A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o prazo prescricional da ação para exigir a entrega de bem usado em infração ambiental, quando o próprio infrator é o depositário, passa a contar da data em que ele, notificado, se recusou a restituí-lo às autoridades. Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso de um infrator que alegava a prescrição da ação ajuizada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para que ele entregasse a embarcação utilizada no cometimento da infração, da qual fora nomeado depositário. O infrator foi autuado por praticar pesca de camarão com arrasto de fundo sem permissão do órgão competente. O juízo de primeiro grau reconheceu a prescrição da ação do Ibama, mas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) reformou a sentença, ao entendimento de que a relação existente entre as partes não era de infrator e órgão fiscalizador, mas de depositário e administração pública. Nessa hipótese, para o TRF4, a prescrição deveria ser regulada pelo Código Civil, e não pela legislação que rege a ação punitiva ou de cobrança da administração pública. Ação teve origem na negativa de entrega do bem Ao STJ, o infrator alegou que a prescrição de qualquer ação apresentada pela administração pública federal tem como termo inicial a prática do ato ou o fato do qual se originou – que seria, no caso, a lavratura do auto de infração pelo Ibama. O relator do recurso na Primeira Turma, ministro Paulo Sérgio Domingues, explicou que a apreensão de bens utilizados em infração ambiental e a eventual designação de depositário para guardá-los estão regulamentadas na Lei 9.905/1998 e no Decreto 6.514/2008. No caso em análise, o ministro verificou que o fato que originou a ação do Ibama para a entrega da embarcação confiada ao depositário foi precisamente a inércia deste após ser notificado para apresentar o bem. “Tal pretensão não é a punitiva, que surge com a infração, mas a de reaver a coisa dada em depósito, que surge com o descumprimento do artigo 627 do Código Civil, segundo o qual o depositário tem a obrigação de guardar o bem até que o depositante o reclame”, disse. Prazo prescricional começa com descumprimento do dever de restituição De acordo com o relator, os artigos 105 e 106, II, do Decreto 6.514/2008 facultam ao Ibama nomear o autuado depositário dos bens apreendidos. Nessa situação – observou o ministro –, a obrigação de restituir só será mantida se a autuação for confirmada pelo julgamento do processo administrativo, como ocorreu no caso dos autos. “No caso em que a guarda de bem apreendido por infração ambiental for, com fundamento no artigo 105 do Decreto 6.514/2008, confiada ao próprio infrator, a pretensão do órgão ambiental de reaver a coisa surge, e o respectivo prazo prescricional é deflagrado, quando o depositário, violando o artigo 627 do Código Civil, é notificado para cumprir o seu dever de restituição, mas se recusa a fazê-lo”, resumiu. Leia o acórdão no REsp 1.853.072.

Engenheiro de campo não receberá adicional de transferência por acompanhar obras em outros estados

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um engenheiro de campo de Ribeirão Preto (SP) que pretendia receber o adicional de transferência por ter prestado serviço em diversas cidades. Segundo o colegiado, não ficou comprovada a mudança de domicílio, um dos elementos que caracterizam a transferência. Serviços em várias cidades Na ação, o engenheiro, que morava em Ribeirão Preto (SP), disse que foi admitido em 2002 pela Zopone - Engenharia e Comércio Ltda., de Bauru (SP), e prestou serviços em diversas localidades até o fim do contrato, em 2017. Nesse período, segundo ele, foi submetido a sucessivas transferências secom@tst.jus.brprovisórias, na maioria das vezes para cidades a mais de 2.500 quilômetros de distância de seu domicílio original, como Belém (PA), Cuiabá (MT), Porto Velho (RO) e Manaus (AM). Ao pedir o adicional, ele alegou que a empresa, mesmo tendo obras em São Paulo, optou por transferi-lo para lugares distantes, sem ao menos compensar todo o prejuízo da falta de convívio familiar, social e afetivo. Sem mudança de domicílio O juízo de primeiro grau deferiu o pedido, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) afastou o pagamento da parcela. De acordo com o TRT, o cargo de engenheiro de campo implica trabalhar nos locais onde a empregadora tenha empreendimentos, com deslocamentos a cada nova obra. Salientou ainda que, embora as transferências fossem provisórias, não houve mudança de domicílio, porque a empresa pagava passagens aéreas para que ele retornasse constantemente a Ribeirão Preto. Característica da profissão O ministro Dezena da Silva, relator do agravo pelo qual o engenheiro tentava rediscutir o tema no TST, explicou que o adicional de transferência, conforme o artigo 469 da CLT, somente é devido se o deslocamento for provisório e implicar mudança de domicílio, o que não foi o caso, uma vez que a empresa pagava passagens para o engenheiro voltar para casa. Segundo o ministro, o deslocamento eventual do empregado para localidade diversa daquela do contrato de trabalho não acarreta necessariamente a mudança de seu domicílio profissional. No mesmo sentido, o ministro Amaury Rodrigues observou que a prestação de serviços em outros locais, em se tratando de um engenheiro de campo, é uma característica marcante da profissão. A decisão foi por maioria, vencido o ministro Hugo Scheuermann. (Lourdes Tavares/CF) Processo: AIRR-10977-68.2017.5.15.0113 

Demora na punição garante reintegração de bancário demitido por justa causa

Por unanimidade, a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho anulou a demissão por justa causa aplicada a um bancário do Banco do Brasil S.A. em Itarema (CE), acusado de usar cartão do gerente para estornar débitos em sua conta pessoal. A penalidade foi afastada em razão da demora do banco em aplicar a punição. Banco alega má-fé e perda de confiança Segundo apurado, o bancário, em novembro de 2008, fez 176 estornos de sua conta corrente, no valor de R$ 256,80, usando a senha pessoal do gerente geral. Segundo o banco, os atos foram praticados com intenção e má-fé e resultaram na perda da confiança no empregado, demandando a aplicação da punição extrema de demissão por justa causa, em maio de 2009. Bancário disse que não pôde se defender No mesmo ano, o bancário ajuizou a ação trabalhista pedindo sua reintegração. Ele alegou que não havia sido comunicado formalmente sobre a investigação nem teve possibilidade de produzir provas, mas apenas foi chamado para uma “entrevista estruturada” em que não pôde se manifestar. Dispensa ocorreu seis meses depois Em maio de 2012, a 1ª Vara do Trabalho de Fortaleza concluiu que houve exagero na pena aplicada. Segundo a sentença, o empregado havia reconhecido nos autos ter utilizado a senha do gerente para realizar os estornos, mas que depois os valores foram devolvidos. A decisão também aponta que não houve prejuízo financeiro nem à imagem do banco. O Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE) manteve a sentença, mas por outro motivo: a demora de quase seis meses entre o conhecimento da fraude e a aplicação da penalidade. Segundo o TRT, o desvio comportamental que leve a demissão por justa causa, uma vez detectado, deve ser imediatamente seguido da reprimenda. Se o empregado continua a trabalhar normalmente, presume-se que tenha sido perdoado. Demora caracterizou perdão tácito No TST, o caso foi inicialmente analisado pela Primeira Turma. Ao manter a reintegração, o colegiado aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a demissão sem justa causa de empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, como o Banco do Brasil, admitidos por concurso público, deve ser devidamente motivada (Tema 1.022 de repercussão geral). Já na SDI-1, o relator do recurso do banco, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, observou que o caso em questão tem uma particularidade, porque a dispensa por justa causa foi afastada em razão de ausência de imediatidade na punição. Embora tivesse ciência da falta grave, o Banco do Brasil demorou a tomar medidas punitivas, o que configura perdão tácito, ou seja, presume-se que a falta foi perdoada. (Ricardo Reis/CF) Processo: E-RR-1825-73.2011.5.07.0001

Mantida condenação de cuidador de idoso por tentativa de latrocínio e extorsão

A 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve condenação de cuidador de idoso por tentativa de latrocínio e extorsão. As penas foram redimensionadas para 13 anos, 6 meses e 19 dias de reclusão, em regime inicial fechado. A vítima, idosa com 79 anos, contratou o auxiliar de enfermagem para ajudá-la a cuidar do marido, diagnosticado com Alzheimer. Em determinado momento, notou o desaparecimento de dinheiro e, desconfiada do acusado, decidiu demiti-lo. Dias depois, o homem retornou à residência para supostamente buscar um calçado e tentou matá-la com uma faca e um martelo. Acreditando que o crime havia sido consumado, pegou a carteira da vítima e fugiu. Após duas semanas, passou a ameaçá-la de morte, solicitando valores entre R$ 25 mil e R$ 50 mil. Em seu voto, o relator do recurso, Marcos Alexandre Coelho Zilli, destacou que o réu premeditou a ação e utilizou de violência para possibilitar a subtração patrimonial. “O fato de o delito ter sido cometido na residência da ofendida é revelador de uma maior reprovabilidade. Com efeito, goza o domicílio de especial proteção constitucional – tratando-se de asilo inviolável – por constituir-se em espaço dedicado à convivência do indivíduo e de sua família, além de tratar-se de ambiente onde pode desenvolver a sua intimidade. Assim, a ação do acusado revela maior audácia, inserindo-se no âmbito das circunstâncias do crime como especial aspecto indicativo de maior reprovabilidade”, afirmou. Completaram o julgamento os desembargadores Guilherme de Souza Nucci e Leme Garcia. A decisão foi unânime. Apelação nº 1521971-45.2022.8.26.0050

Ampliação de benefícios sociais às vésperas das eleições

Fatos Trata-se de ação constitucional (ação direta de inconstitucionalidade) na qual o Partido Novo questiona a validade da Emenda Constitucional nº 123/2022, que adotou as seguintes medidas: (i) instituiu estado de emergência no ano de 2022 , em razão do aumento inesperado do preço dos combustíveis; (ii) criou vantagens para tornar os biocombustíveis mais competitivos no mercado; (iii) ampliou o pagamento de benefícios sociais, como o auxílio gás e aqueles vinculados ao Programa Auxílio Brasil; e (iv) criou auxílio financeiro para caminhoneiros autônomos e motoristas de táxi. A Emenda Constitucional nº 123/2022 foi aprovada em 14 .07. 2022 - perto das eleições, que ocorreram em 02.10.2022. A ampliação e a criação de novos benefícios sociais resultaram em um gasto público de R$ 41 bilhões, realizado três meses antes das eleições. Por isso, a emenda ficou conhecida como “PEC Kamikaze” ou “PEC das Bondades”. O partido alegou que a ampliação de benefícios sociais pouco antes das eleições influenciou os eleitores a votarem em determinados candidatos, violando a liberdade de voto e comprometendo a normalidade das eleições. Questões jurídicas A aprovação de uma emenda constitucional que amplia benefícios sociais às vésperas da eleição influencia indevidamente o voto dos eleitores? Fundamentos da decisão A lei eleitoral (art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/1997) proíbe que, no ano de eleições, o governo distribua bens, valores ou benefícios à população, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais que já estavam em andamento no ano anterior. Essa regra existe para garantir que as eleições sejam justas, evitando que esses benefícios influenciem a escolha dos eleitores e criem desigualdade entre os candidatos. Além disso, o art. 16 da Constituição proíbe mudanças na lei eleitoral no ano de eleições. A Emenda Constitucional nº 123/2022 declarou estado de emergência devido ao aumento inesperado dos preços do petróleo e combustíveis. No entanto, como a situação econômica à época não era grave o suficiente para justificar essa medida, não existia fundamento na Constituição ou na lei eleitoral para a distribuição de benefícios sociais perto das eleições. Essa prática pode influenciar indevidamente o voto dos cidadãos, comprometendo a igualdade de oportunidades entre os candidatos. Além disso, representa alteração da legislação eleitoral em ano de eleição, violando o art. 16 da Constituição. Embora os benefícios tenham sido distribuídos apenas em 2022 e o prazo de vigência da Emenda Constitucional nº 123/2022 já tenha se encerrado, é necessário declarar sua inconstitucionalidade, para evitar que medidas semelhantes prejudiquem a igualdade na disputa eleitoral no futuro. Os cidadãos que receberam os benefícios de boa-fé não precisarão devolvê-los. Votação e julgamento Decisão por maioria. Voto que prevaleceu: Min. Gilmar Mendes Voto(s) divergente(s): Min. André Mendonça e Min. Nunes Marques. Resultado do julgamento Por maioria de votos, o STF entendeu que a Emenda Constitucional 123/2022 viola o princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, ao ampliar a concessão de benefícios sociais em ano eleitoral. Para o Tribunal, apesar do término do prazo de vigência da norma em 31/12/2022, é necessário declarar a inconstitucionalidade da emenda para evitar que eventuais medidas semelhantes prejudiquem a igualdade na disputa eleitoral. O colegiado afirmou que a decisão não afeta os cidadãos que receberam os benefícios de boa-fé. Classe e Número: ADI 7212

Herdeiros não respondem por dívida condominial antes da partilha dos bens, decide Terceira Turma

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que os herdeiros de imóvel com dívida perante o condomínio não podem ser diretamente responsabilizados por esse débito antes da conclusão da partilha dos bens. No caso em análise, um condomínio ajuizou ação de cobrança de débitos condominiais contra o pai dos herdeiros, o qual faleceu após a ação ter transitado em julgado. Na execução, ele foi substituído pelo seu espólio, e, por se tratar de inventariança dativa, houve o ingresso e a habilitação dos herdeiros na ação, conforme a regra do artigo 12, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (CPC) de 1973. Após várias tentativas malsucedidas de leiloar o imóvel, a fase de cumprimento de sentença foi suspensa, e o condomínio passou a executar diretamente os herdeiros, o que motivou o bloqueio de valores em suas contas pessoais. Os herdeiros pediram a liberação do dinheiro, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a penhora de valor excedente a 50 salários mínimos, ao entendimento de que os sucessores responderiam solidariamente pela dívida condominial. Herdeiros substituem inventariante dativo como representantes processuais do espólio A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, explicou que o artigo 12, parágrafo 1º, do CPC/1973 traz uma dicotomia na definição do polo passivo, ou da representação processual, nas ações que envolvem pessoas falecidas: como regra, o polo passivo será ocupado apenas pelo espólio, representado pelo inventariante; nas hipóteses em que houver inventariança dativa, o polo passivo será ocupado pelo espólio, devendo também os herdeiros ou sucessores participar do processo. “Prevendo a possibilidade de o inventariante judicial ou dativo não ser uma pessoa próxima aos herdeiros e sucessores e de não gozar da plena confiança deles, quis o legislador, nessa hipótese, permitir que herdeiros e sucessores exercessem um maior controle a respeito dos atos praticados, viabilizando, inclusive, que eles substituíssem processualmente o inventariante”, disse a relatora. Segundo a ministra, no caso de inventariança dativa, a substituição não ocorre nos polos, mas nos representantes processuais do espólio, que deixa de ser o inventariante e passa a ser o herdeiro ou sucessor. Controle mais apurado das atividades do inventariante dativo Essa conclusão, esclareceu, pode ser verificada pelo critério topológico: o artigo 12 do CPC/1973 está localizado no capítulo da capacidade processual, que regula a aptidão para estar em juízo, tratando o caput desse dispositivo da “representação em juízo”. Além disso, a ministra ponderou que, caso se entendesse que a inventariança dativa provocaria a substituição de parte – do espólio pelos herdeiros e sucessores –, com a responsabilização imediata, pessoal e direta destes em relação aos débitos contraídos pelo falecido pai, e não a substituição da representação processual, “bastaria que um dos herdeiros, desprovido de patrimônio e sob o risco iminente de ver a herança utilizada integralmente para a satisfação dessa dívida, provocasse artificialmente uma situação conflituosa e, consequentemente, a nomeação do inventariante dativo”. “Nessa hipótese, é razoável supor que o credor deixará de perseguir o crédito do espólio e passará a direcionar a cobrança ou execução, apenas por haver inventariança dativa, ao herdeiro ou sucessor que possui patrimônio pessoal, o que subverteria integralmente a lógica segundo a qual é o espólio quem responde pelas dívidas do falecido até a partilha”, comentou a relatora. Nancy Andrighi ressaltou, por fim, que a regra do artigo 75, parágrafo 1º, do CPC/2015, que substituiu a do CPC/1973, passou a estabelecer de maneira mais precisa que, “quando o inventariante for dativo, os sucessores do falecido serão intimados no processo no qual o espólio seja parte”. “Em se tratando de inventariança dativa, há que se permitir que os herdeiros ou sucessores exerçam um controle mais apurado a respeito das atividades desenvolvidas pelo inventariante dativo, que, como regra, não conhecem”, afirmou. Nesses casos, a ministra disse que bastará a esses herdeiros e sucessores serem cientificados da existência das ações de que o espólio faça parte, viabilizando-se a participação em contraditório, sem que isso implique a sua responsabilização direta e pessoal. Leia o acórdão no REsp 2.042.040.

MPT pode ser acionado em processo para revisão de ação civil pública

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a legitimidade do Ministério Público do Trabalho (MPT) para figurar como réu numa ação revisional movida pela Arcelormittal Bioflorestas Ltda. contra decisão em ação civil pública que havia resultado em sua condenação. Para o colegiado, o MPT deve responder às ações que estejam no âmbito de suas funções institucionais, uma vez que está legitimado para ajuizar a ação civil pública. Liberação da terceirização pelo STF motivou ação revisional O MPT ajuizou a ação civil pública contra a Arcelormittal em 2002, alegando terceirização ilícita. O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) condenou a empresa e a proibiu, de forma definitiva, de terceirizar serviços relacionados à sua atividade-fim, especialmente as de florestamento, reflorestamento e transformação do carvão vegetal. Em 2021, a empresa apresentou a ação revisional contra o MPT argumentando que, em 2019, o Supremo Tribunal Federal havia reconhecido a licitude da terceirização em atividades fim e meio, modificando o entendimento até então vigente sobre o tema. Tanto a Vara do Trabalho de Diamantina (MG) quanto o TRT consideraram que a ação deveria ter sido apresentada contra a União. De acordo com o TRT, o MPT, embora possa ajuizar ações, é um órgão administrativo da União, sem personalidade jurídica. Para relatora, MPT pode tanto propor quanto responder a ações A ministra Liana Chaib, relatora do recurso de revista da empresa, assinalou que, por falta de previsão legal, o tema sempre gerou controvérsia, e o posicionamento prevalecente tem sido o de que cabe à Advocacia Geral da União a defesa nas reclamações contra o Ministério Público. No entanto, a seu ver, a melhor interpretação sobre a atuação jurisdicional do MPT é a que dá máxima efetividade às suas funções institucionais - a defesa da ordem jurídica. Na avaliação da ministra, a legitimidade passiva (possibilidade de responder a uma ação) deriva de sua legitimidade ativa, ou seja, se o MPT pode ajuizar ações civis públicas, também pode responder pelas ações revisionais opostas a elas. O entendimento foi unânime, e o colegiado determinou o retorno do processo à Vara do Trabalho de Diamantina para que julgue a ação. (Lourdes Tavares/CF) Processo: RR-10503-78.2021.5.03.0085

Não cabe fixação de honorários para advogado que não precisou atuar em processo extinto sem resolução de mérito

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é possível arbitrar honorários sucumbenciais quando não há nenhuma atuação do advogado da parte vencedora em processo extinto sem resolução de mérito. A partir desse entendimento, o colegiado afastou a possibilidade de fixação da verba honorária em favor dos defensores de uma empresa que foi alvo de execução movida pela Caixa Econômica Federal. Como o banco deixou de complementar as custas iniciais, o processo foi encerrado sem que a defesa precisasse fazer qualquer intervenção. “Muito embora a regra seja a fixação de honorários sucumbenciais na extinção do processo sem resolução de mérito, impõe-se pontuar que, se os honorários têm por objetivo remunerar a atuação dos advogados, inexistindo qualquer atuação do profissional, não há razão para o arbitramento da verba honorária”, observou a relatora, ministra Nancy Andrighi. Após a extinção do processo, a empresa recorreu ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) para reivindicar a verba honorária, mas o pedido foi negado. Para a corte local, quando não há atuação de advogado, deve ser afastado o princípio da causalidade em relação aos honorários de sucumbência. Em recurso especial, a empresa argumentou, com base no artigo 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil (CPC), que os honorários devem ser arbitrados mesmo na hipótese de extinção do processo sem resolução de mérito. Não é razoável remunerar defensor por trabalho que não existiu Segundo Nancy Andrighi, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios se orienta pelos princípios da sucumbência e da causalidade, mas há ainda um terceiro aspecto ligado à essência do instituto, que é o seu caráter de remuneração da atividade dos advogados. A relatora disse que os critérios listados no parágrafo 2º do artigo 85 do CPC – entre eles o grau de zelo, o trabalho realizado e o tempo exigido – “demonstram que os honorários sucumbenciais estão intimamente atrelados à efetiva atuação profissional do causídico na defesa dos interesses de seu cliente”. Para a ministra, “não é razoável remunerar trabalho que não existiu”. Precedentes do STJ já abordaram questões parecidas Nancy Andrighi lembrou que a questão do cabimento ou não de condenação em honorários na hipótese de ausência de atuação da defesa já foi analisada sob outros ângulos pelo STJ. A ministra citou julgados proferidos sob o CPC/1973 que afastam a verba honorária quando ocorre a revelia e o réu vence a causa. No âmbito da Terceira Turma, ela destacou o acórdão do REsp 1.842.356, que examinou especificamente a hipótese de cancelamento da distribuição por falta de complementação das custas judiciais. No entendimento da relatora, o acórdão recorrido está em consonância com a tese de que a inexistência de atuação do advogado da parte vencedora impede a fixação de honorários sucumbenciais em seu favor. Leia o acórdão no REsp 2.091.586.

Técnico que iniciou auxílio-doença durante aviso-prévio terá contrato estendido

A Vale S.A. deverá manter o salário de um técnico em eletromecânica que entrou em auxílio-doença sem relação com trabalho durante o aviso-prévio até o fim do benefício. A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho acolheu recurso da empresa apenas para restringir o pagamento, antes deferido até a decisão final da reclamação trabalhista (trânsito em julgado). Auxílio-doença começou durante aviso-prévio O técnico, que trabalhava na Vale desde 2005, foi demitido em 20 de setembro de 2021, e seu aviso-prévio proporcional ia até 7 de dezembro. Contudo, em novembro, o INSS deferiu auxílio-doença até março de 2022, em razão de lombalgia. Mesmo assim, a empresa rescindiu o contrato ao fim do aviso, quando ele ainda recebia o benefício. Na reclamação trabalhista, apresentada em janeiro de 2022, ele sustentou que a dispensa foi ilegal e pediu para ser reintegrado no emprego. O juízo da 4ª Vara do Trabalho de Parauapebas (PA) assinalou que a doença que motivou o auxílio não estava relacionada ao trabalho, mas apenas o impedia de trabalhar. Porém, concluiu que o técnico não poderia ser dispensado naquela circunstância e determinou sua reintegração após término do afastamento. O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP), por sua vez, afastou a reintegração, mas condenou a empresa a pagar os salários entre a data final do auxílio e a do término da ação trabalhista (trânsito em julgado, em que não cabe mais recurso). Contrato vai até o fim do benefício No recurso de revista, a Vale argumentou que, como não se tratava de auxílio-acidente, mas por doença comum, não haveria direito à estabilidade nem ao pagamento de salários vencidos. O relator, ministro Augusto César, porém, aplicou ao caso o entendimento consolidado do TST (Súmula 371) de que, quando o auxílio-doença é concedido durante o aviso-prévio, os efeitos da dispensa só se concretizam depois de expirado o benefício. Assim, a determinação do TRT de estender o contrato até o trânsito em julgado da ação contraria esse entendimento. A decisão foi unânime. (Guilherme Santos/CF) Processo: RR-58-82.2022.5.08.0131

Servidor do interior de São Paulo não consegue vale-refeição concedido na capital

O Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran-SP) não terá de pagar a um agente de trânsito de São Carlos, no interior do estado, o mesmo valor do vale-refeição pago às pessoas lotadas na Grande São Paulo e na região metropolitana. Ao afastar a condenação, a Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho seguiu o entendimento de que, não havendo lei específica, não cabe ao Poder Judiciário estender o benefício com base no princípio da isonomia. Vale-refeição era menor Na reclamação trabalhista, o servidor disse que, de 2012 a 2016, o Detran concedeu um vale-refeição de R$ 15 por dia de trabalho somente na capital e na região metropolitana de São Paulo. Com base no princípio da igualdade, ele pediu a extensão do benefício no período em que não havia sido concedido. O juízo da 1ª Vara do Trabalho de São Carlos (SP) acolheu o pedido. Segundo a sentença, o Detran, ao optar por conceder o benefício, embora não fosse obrigado, deveria fazê-lo de forma igual para todos, a fim de evitar discriminação e respeitar o princípio da isonomia. O Tribunal Regional da 15ª Região (SP) manteve a decisão. Contrariedade ao entendimento do STF O relator do recurso de revista do Detran, desembargador convocado José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, explicou que a extensão do direito ao vale-refeição ao servidor do interior com base no princípio da isonomia, sem uma lei específica que conceda esse direito indistintamente a todos, contraria a Súmula Vinculante 37 do Supremo Tribunal Federal (STF). Ela estabelece que não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos com fundamento na isonomia. A decisão foi unânime. (Bruno Vilar/CF) Processo: RR-10444-36.2017.5.15.0008

União deve fornecer medicamento a criança com nanismo

A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou decisão que determinou à União fornecer o medicamento Voxzogo (princípio ativo Vosoritida) a uma criança com acondroplasia, doença óssea conhecida por nanismo. Para os magistrados, laudo médico demonstrou a necessidade do tratamento. A ação foi proposta contra a União, para obter o remédio Voxzogo, quando a criança tinha três anos. O medicamento é indicado a partir dos dois anos de idade. Após a 1ª Vara Federal de Dourados/MS determinar o fornecimento da medicação, a União recorreu ao TRF3. Em novembro de 2023, decisão monocrática da desembargadora federal Adriana Pileggi, relatora do processo, manteve a concessão do medicamento. Com isso, a União entrou com novo recurso sustentando falta de comprovação de benefícios do remédio, custo relevante ao erário e ausência de imprescindibilidade do tratamento. Ao analisar o caso, a relatora seguiu entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TRF3 no sentido de que, para a concessão gratuita de medicamentos de alto custo não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS), são necessários: laudo médico fundamentado sobre a necessidade do fármaco e ineficácia dos fornecidos pelo SUS; incapacidade financeira para custeio e registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo o laudo médico, o remédio pode atuar na melhora do crescimento esquelético e no desenvolvimento próximo ao de uma pessoa sem a enfermidade. Além de evitar prejuízos de funcionalidades, membros, cotovelo, perda auditiva, limitação das mãos, atraso motor, cirurgia de correções de complicações, entre outros. “Conclui-se que a decisão monocrática observou os limites objetivamente definidos no referido dispositivo processual”, observou a magistrada. A Terceira Turma, por unanimidade, negou o pedido da União e determinou o fornecimento da medicação. Assessoria de Comunicação Social do TRF3

Shopping pode instalar lojas similares na mesma área, desde que contratos sejam respeitados

​A instalação de lojas do mesmo ramo em um shopping center não configura necessariamente atividade predatória ou ofensa à organização do comércio no local (tenant mix), desde que não haja violação dos contratos firmados com os lojistas. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria de votos, que um shopping localizado no Rio de Janeiro não agiu de forma irregular ao permitir a instalação de um restaurante de culinária japonesa em frente a outro já existente. A inauguração do concorrente ocorreu em 2018, quando a previsão contratual de preferência do primeiro restaurante já estava extinta. “A previsão de preferência apenas temporária não trouxe excessiva desvantagem para o locatário, seja porque a cláusula estava claramente redigida e, portanto, passível de avaliação de risco antes mesmo da instalação do restaurante, seja porque a admissão de outro restaurante do mesmo ramo trouxe aumento no faturamento do recorrido, ainda que se afirme que essa situação não tenha refletido nos lucros”, destacou o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, autor do voto que prevaleceu no colegiado. Concorrente direto foi autorizado 12 anos após o fim do acordo inicial O primeiro restaurante e o shopping assinaram contrato de locação que previa a exclusividade na exploração da culinária japonesa por cinco anos, condicionada a consulta sobre possíveis concorrentes. Passados 12 anos do fim do acordo inicial, a administração do shopping autorizou a instalação de outro restaurante do mesmo segmento. A iniciativa levou o primeiro restaurante a ajuizar ação para barrar a abertura do concorrente ou rescindir o contrato. O juízo de primeiro grau determinou a rescisão do contrato de locação, mas negou os demais pedidos sob a alegação de que não estava prevista a continuidade do direito de preferência por tempo indeterminado. A decisão, entretanto, foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que apontou violação ao tenant mix e determinou o pagamento de indenização. Ao STJ, o shopping argumentou que a alteração do tenant mix se ampara nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. Além disso, negou a prática de atividade predatória, pois a exclusividade para explorar o segmento culinário se limitaria aos 60 meses do contrato inicial. Para relator, alteração do tenant mix não violou a boa-fé objetiva Villas Bôas Cueva observou que, na relação entre lojistas e o shopping center, devem prevalecer as condições pactuadas nos contratos de locação, salvo se houver desvantagem excessiva para os locatários. Na avaliação do ministro, a previsão temporária de direito de preferência não representou excesso de desvantagem para o locatário, e, na ocasião da instalação do restaurante concorrente, essa prerrogativa já estava extinta havia muito tempo. “O contrato estipulava claramente até que momento o restaurante poderia contar com o direito de preferência, de modo a planejar suas atividades e adotar estratégias de acordo com esse dado. Do mesmo modo, o shopping aguardou a finalização do prazo para traçar novos delineamentos”, ressaltou o relator. O ministro explicou que o tenant mix visa atrair o maior número possível de consumidores e incrementar as vendas. No entanto – prosseguiu –, não é possível garantir que o aumento do número de clientes e das vendas, como ocorreu nesse caso, resultará no incremento dos lucros dos lojistas, o que depende de causas variadas. Ainda segundo o ministro, diversos centros comerciais surgiram ao redor do shopping com o passar do tempo. Dessa forma, para ele, a alteração do tenant mix não pode ser considerada uma conduta desarrazoada, a ponto de violar a boa-fé objetiva. “Não há como esperar que o shopping mantenha a mesma organização por 18 anos, mormente se a alteração do tenant mix está prevista contratualmente e é necessário o enfrentamento das novas situações de mercado”, concluiu Villas Bôas Cueva ao prover o recurso especial. Leia o acórdão no REsp 2.101.659.

Agência de viagens é condenada por desistir de recontratar agente por estar grávida

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho aumentou para R$ 18 mil o valor da indenização a ser paga a uma agente de viagens pela RRBI Tour Viagens Ltda., que desistiu de recontratá-la após ela informar que estava grávida. Para o colegiado, o valor de R$ 6 mil fixado na instância anterior era muito baixo para reparar o dano moral sofrido. Convite e recusa registrados em mensagens Na ação trabalhista, a profissional contou que havia prestado serviços para a RRBI de julho de 2017 a outubro de 2018. Em maio de 2019, recebeu mensagens de WhatsApp da dona da empresa convidando-a para retornar ao emprego, porque os clientes pediam muito que ela voltasse. Dias depois, ao conversaram pessoalmente, ela informou que estava grávida, e a proprietária passou a dizer que seria necessário levar o fato à franqueadora, CVC Brasil. Na sequência, recebeu um e-mail que dizia que a empresa não havia autorizado a recontratação, e a dona da RRBI, pelo aplicativo de mensagem, perguntou se havia possibilidade de voltarem a conversar após o nascimento do bebê. A troca de mensagens foi apresentada na ação como prova da discriminação. Condenação O juízo da Vara do Trabalho de Xanxerê (SC) reconheceu a conduta discriminatória das empresas e condenou-as solidariamente a pagar R$ 18,5 mil de indenização. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) excluiu a CVC da condenação, por entender que não ficou comprovada sua efetiva participação na negociação pré-contratual. O TRT também reduziu o valor da reparação para R$ 6 mil, por considerar que a negociação se deu em tom amigável e não teria causado maiores transtornos à profissional, que não chegou a sair do emprego que tinha na época. Realidade brasileira O relator do recurso de revista da trabalhadora, ministro Mauricio Godinho Delgado, ressaltou que a Constituição Federal proíbe qualquer prática discriminatória contra a mulher no contexto de trabalho. Mas, “lamentavelmente, na realidade brasileira”, ainda há um grau elevado de tolerância à discriminação, incluindo as fases de celebração e término do contrato de trabalho. Nesses casos, a indenização tem de ser razoável e proporcional à gravidade da conduta, para que esta não fique impune e para desestimular práticas inadequadas aos parâmetros da lei. A decisão foi unânime. (Lourdes Tavares/CF) Processo: RR-1227-28.2019.5.12.0025

Improcedência liminar da ação rescisória só é possível nas hipóteses do artigo 332 do CPC

​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o julgamento liminar de improcedência da ação rescisória é possível desde que esteja presente alguma das hipóteses do artigo 332 do Código de Processo Civil (CPC) – por exemplo, se o pedido contrariar súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) ou do STJ, ou decisões tomadas sob a sistemática dos recursos repetitivos. Ao dar provimento ao recurso especial em julgamento, o colegiado entendeu que, não estando presente nenhuma das hipóteses do artigo 332 do CPC, a ação rescisória é via adequada para tentar desconstituir acórdão que extinguiu, sem resolução de mérito, uma ação declaratória de impenhorabilidade de bem de família em razão de coisa julgada formada em embargos à execução anteriores opostos pelo cônjuge da parte. Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, “nessa hipótese, o vício em que se fundou o acórdão rescindendo é insuscetível de correção e impede a repropositura da ação pela parte, nos termos do artigo 485, inciso V, artigo 486, caput e parágrafo 1º, e artigo 966, parágrafo 2º, inciso I, do CPC”. De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a ação rescisória deveria ser extinta por ausência de interesse processual e pela inadequação da via eleita. Para o TJSP, a coisa julgada formada nos embargos à execução ajuizados pelo marido da autora da rescisória também produziria efeitos em relação a ela, ainda que não tenha sido parte naquela ação. Sob o rótulo de falta de interesse e inadequação da via, TJSP analisou o mérito Segundo a ministra Nancy Andrighi, embora o acórdão do TJSP tenha extinguido a ação rescisória mesmo antes da citação do réu, declaradamente sem análise do mérito, por ausência de interesse recursal e por inadequação da via eleita, o tribunal paulista, na verdade, adotou razões de mérito para julgar a rescisória liminarmente improcedente: entre outros fundamentos, a decisão foi baseada em precedentes do TJSP sobre a expansão subjetiva dos efeitos da coisa julgada. Fora das hipóteses do artigo 332 do CPC, a ministra apontou que não é admissível o julgamento liminar de improcedência da rescisória, especialmente quando há adoção de entendimento de mérito sob o rótulo de ausência de interesse processual ou inadequação da via eleita. Citando julgados do STJ, como o REsp 1.706.999, a relatora disse que a questão da formação de litisconsórcio necessário ou unitário entre cônjuges é matéria de alta complexidade, na qual se observam, sobretudo, a natureza e as particularidades das relações jurídicas de direito material. “Nesse contexto, ainda que se compreenda que uma das faces do interesse processual seria a ‘adequação da via eleita’, fato é que, uma vez delineada na petição inicial a alegada violação manifesta de norma jurídica (artigo 966, inciso V, do CPC), a recorrente possui interesse processual para ver examinada a pretensão rescisória também porque essa é a única via existente para que, em tese, seja possível a pretendida desconstituição da coisa julgada que se formou pelo acórdão rescindendo”, afirmou. Acórdão impede propositura de nova ação sobre o mesmo tema Nancy Andrighi ressaltou que, embora o acórdão contra o qual foi proposta a ação rescisória não tenha conteúdo de mérito, a decisão impede nova propositura de demanda pela recorrente, pois não é superável o óbice da extinção do processo por ofensa à coisa julgada formada nos embargos à execução. “Isso porque trata a hipótese de um vício insanável, de modo que apenas a ação rescisória poderá ser considerada a via adequada para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida pela parte, eis que é impossível a correção do vício para a repropositura da ação declaratória”, concluiu a ministra ao dar provimento ao recurso. Leia o acórdão no REsp 2.083.367.

Google Brasil deve fornecer dados telemáticos para apuração de crime de racismo

A Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal 3ª Região (TRF3) manteve decisão que decretou a quebra de sigilo telemático e determinou a Google Brasil Internet Ltda o fornecimento de dados destinados a investigação criminal para apurar a prática de racismo durante a transmissão de um programa na internet. Para os magistrados, a atividade de comunicação investigada ocorreu em território nacional, devendo se submeter à disciplina da jurisdição brasileira, segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do próprio TRF3. A 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo/SP havia determinado à empresa Google que fornecesse os dados cadastrais para apuração criminal, assim como o endereço IP vinculado a um usuário da plataforma “Twitch” que, no dia 26 de janeiro de 2021, teria proferido comentários racistas durante transmissão do programa “Marca Página”, então disponibilizado pelo canal “Omelete”. A “big tech” norte-americana e suas filiais brasileira e europeia entraram com mandado de segurança no TRF3 e requereram a anulação da decisão de primeiro grau. Sustentaram que o endereço eletrônico requisitado era acessado no Espaço Econômico Europeu (EEE), sob a custódia de dados da Google Ireland, constituída segundo as leis irlandesas e sujeita ao Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da União Europeia. Alegaram ainda que houve equívoco quanto à adoção da premissa de que o Marco Civil da Internet autorizaria a requisição direta de dados. Em decisão monocrática, o relator do processo, desembargador federal Hélio Nogueira, havia indeferido o pedido de tutela de urgência mantendo as impetrantes obrigadas a executar a quebra de sigilo telemático e a pagar multa diária de R$ 5 mil na hipótese de descumprimento. Ao analisar o recurso, o colegiado manteve a decisão monocrática. “O Brasil possui jurisdição sobre fatos relacionados a comunicações eletrônicas cujos registros tenham sido objeto de coleta, armazenamento, guarda ou tratamento em território nacional, não sendo admissível que a mera opção empresarial de transferir o armazenamento de dados para Estados estrangeiros, com legislações mais protetivas, constitua fundamento suficiente a amparar a recusa em atender a ordens judiciais brasileiras”, destacou o relator. O magistrado ressaltou entendimento do STF no sentido de que a cooperação jurídica internacional não constitui via exclusiva para obtenção de dados eletrônicos armazenados em Estado estrangeiro quando há vínculos das informações com o Brasil. “O Supremo declarou também a constitucionalidade da requisição direta de dados de provedores de aplicações de internet sediados no exterior, por parte do Judiciário brasileiro, com base no artigo 11 do Marco Civil da Internet e no artigo 18 da Convenção de Budapeste sobre Crime Cibernético, por força dos princípios da soberania e da independência nacional”, disse. Por fim, o colegiado considerou legal a aplicação de multa por descumprimento da decisão judicial que determinou a quebra de sigilo de dados telemáticos necessários ao esclarecimento da investigação criminal, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. “Mostra-se cabível a imposição de multa cominatória, com fulcro nos artigos 536, parágrafo 1º, e 537, ambos do Código de Processo Civil, cujas normas são subsidiariamente aplicáveis ao processo penal, por força do disposto no artigo 3º do Código de Processo Penal”, concluiu. Assim, a Décima Primeira Turma negou a concessão do mandado de segurança e julgou prejudicado o agravo interno. O caso No dia 26 de janeiro de 2021, um usuário da plataforma “Twitch”, serviço de transmissão ao vivo interativo para conteúdos de entretenimento, identificado como “abacate12345qaw”, teria proferido comentários racistas durante transmissão do programa “Marca Página”, então disponibilizado pelo canal “Omelete”. As suas declarações teriam sido expostas no espaço destinado ao “chat” dos usuários. No decorrer das investigações, foram prestadas informações cadastrais pela “Amazon Web Services” e “Amazon Serviços de Varejo do Brasil”, do grupo proprietário da plataforma “Twitch”, por meio das quais foi possível apurar que o IP utilizado para conexão pelo referido usuário seria proveniente de Lisboa (Portugal), bem como identificar o e-mail utilizado para cadastro na plataforma. Foi então determinado à empresa Google que fornecesse os dados cadastrais do usuário, assim como o IP vinculado à sua criação e os IPs vinculados ao último acesso à respectiva conta, tendo em vista que o investigado teria utilizado as credenciais da sua conta Google para ingressar na transmissão ao vivo realizada no Brasil. A Justiça Federal de São Paulo concluiu que a atividade de comunicação investigada ocorreu em território nacional, estando sujeita à jurisdição brasileira. Mandado de Segurança Criminal 5033520-35.2023.4.03.0000 Assessoria de Comunicação Social do TRF3

TRF3 mantém decisão que obriga Anvisa a liberar importação de prótese hipoalergênica

A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) negou recurso da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e manteve integralmente sentença da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo que obrigou a autarquia a liberar a importação de prótese hipoalergênica para uma mulher que tem problemas ósseos e nas articulações. A Anvisa contestou a decisão do primeiro grau alegando violação de normas que regulam a entrada, no país, de medicamentos e produtos de saúde sem registro, o que poderia representar ameaça à saúde pública. Relator da apelação, o desembargador federal Souza Ribeiro observou que a prótese é de uso estritamente pessoal, não podendo “ser comparada à medicação ou substância sem regulamentação no mercado brasileiro que poderia causar eventuais danos e riscos à população.” Por esse motivo, o magistrado afirmou que as exigências legais citadas pela Anvisa não se aplicam ao caso. A autora da ação comprovou, por meio de laudos médicos, a rejeição aos implantes disponíveis no mercado brasileiro, em razão de alergia aos metais utilizados na confecção, em especial cobalto e vanádio. Ela foi submetida a artroplasia total dos dois joelhos e informou ter a indicação de nova cirurgia, de artroplasia total do quadril, conforme atestado médico juntado. O produto importado foi apontado como “imprescindível à manutenção da vida” da autora. “O direito à saúde, além de qualificar-se como direito fundamental inerente a todas as pessoas, representa consequência indissociável do direito à vida, previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Desse modo, o Poder Público não pode mostrar-se indiferente à efetivação do direito à saúde, sob pena de incorrer em censurável comportamento inconstitucional”, conclui o magistrado. Apelação Cível 5022003-66.2023.4.03.6100 Assessoria de Comunicação Social do TRF3

Porte de pequena quantidade de maconha para uso pessoal

Fatos Trata-se de recurso extraordinário, com repercussão geral (Tema 506), em que se discute se a posse de pequenas quantidades de maconha para uso pessoal deve ser considerada crime. No caso, uma pessoa foi condenada à pena de prestação de dois meses de serviços à comunidade por portar 3 gramas de maconha para consumo próprio. A Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) estabelece que o uso de drogas é crime, mas não prevê a aplicação da pena de prisão (art. 28). A Lei diz que o usuário poderá ser punido com: (i) advertência sobre os efeitos das drogas; (ii) prestação de serviços à comunidade; e (iii) medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. O tráfico de drogas é punido com pena de prisão (art. 33). Questões jurídicas A posse de pequena quantidade de maconha deve ser considerada crime? Qual critério deve ser usado para diferenciar os usuários de maconha dos traficantes? Fundamentos da decisão O STF decidiu que ter pequenas quantidades de maconha para uso pessoal (40 gramas ou 6 pés) continua sendo proibido, mas não é crime. Por isso, no caso analisado, a pessoa condenada pela posse de 3 gramas de maconha para consumo próprio foi absolvida do crime. A decisão se baseia nos direitos à privacidade e à liberdade individual (art. 5º, X, da Constituição). Reconhece, ainda, que tratar o uso de maconha como crime incentiva atividades criminosas associadas ao tráfico, mas não reduz o consumo. Se uma pessoa for flagrada usando maconha, a droga será apreendida. As medidas de advertência e comparecimento a programa ou curso educativo, previstas no art. 28 da Lei de Drogas, continuarão a ser aplicadas como sanções administrativas, sem produzir efeitos penais. Por exemplo: a pessoa que for pega usando maconha não terá registro na ficha criminal. Como a Lei de Drogas não definiu a quantidade de maconha que caracteriza consumo pessoal, atualmente, a Polícia, o Ministério Público e o Poder Judiciário avaliam em cada caso se os acusados devem ser considerados usuários ou traficantes. A ausência de um critério preciso faz com que a lei seja aplicada de forma desigual. Enquanto jovens brancos e de classe média têm chances maiores de serem considerados usuários, é mais comum que jovens pobres, negros e pardos sejam considerados traficantes. Para evitar isso, o STF definiu um critério claro e objetivo: como regra geral, quem estiver com até 40 gramas ou 6 pés de maconha deve ser considerado usuário. Essa regra valerá até que o Congresso Nacional crie uma nova lei sobre o assunto. Esse critério não é absoluto, mas uma presunção relativa que pode ser afastada se ficar provado que a droga não seria usada para consumo próprio. Por exemplo: se uma pessoa for encontrada pela polícia com menos de 40 gramas de maconha, mas estiver com embalagens, balanças ou registros de venda, poderá ser presa em flagrante por tráfico. O consumo de drogas é algo ruim e deve ser desestimulado. Por isso, o governo deve criar programas educativos para esclarecer os riscos do uso de drogas e fornecer tratamento de saúde para os dependentes. Além disso, deve criar órgãos com especialistas em saúde pública para aplicar medidas de apoio aos usuários. Votação e julgamento Decisão por maioria Voto que prevaleceu: Min. Gilmar Mendes (relator) Voto(s) divergente(s): Min. André Mendonça, Min. Nunes Marques, Min. Cristiano Zanin, Min. Dias Toffoli e Min. Luiz Fux. Resultado do julgamento Por maioria, o STF definiu que o porte de maconha para consumo pessoal não é crime e deve ser considerado uma infração administrativa, sem consequências penais, como registro na ficha criminal, por exemplo. As sanções, nesse caso, seriam advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento a programa ou curso educativo. A quantidade de 40 gramas de cannabis sativa e de seis plantas fêmeas foi estabelecida como critério para diferenciar o usuário do traficante. Esse critério, porém, não é absoluto. A autoridade policial poderá apreender a droga e prender a pessoa em flagrante mesmo se a quantidade for inferior, se houver indicativos de intenção de tráfico, como embalagem da substância, registro de operações comerciais e instrumentos como balança. O delegado, nesse caso, deverá detalhar as razões para a medida, que não poderá se basear em critérios arbitrários, sob pena de responsabilidade civil, disciplinar e penal. O juiz responsável por avaliar o caso, por sua vez, poderá afastar o enquadramento como crime caso haja provas suficientes da condição de usuário. Ainda de acordo com a decisão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em articulação com o Executivo e o Legislativo, deverá adotar medidas para cumprir a decisão, além de promover mutirões carcerários para corrigir prisões que tenham sido decretadas fora dos parâmetros determinados pelo Plenário. Tese de julgamento: Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III). As sanções estabelecidas nos incisos I e III do art. 28 da Lei 11.343/06 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta. Em se tratando da posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em Juízo, na forma do regulamento a ser aprovado pelo CNJ. Até que o CNJ delibere a respeito, a competência para julgar as condutas do art. 28 da Lei 11.343/06 será dos Juizados Especiais Criminais, segundo a sistemática atual, vedada a atribuição de quaisquer efeitos penais para a sentença. Nos termos do §2º do artigo 28 da Lei 11.343/06, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito. A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes. Nesses casos, caberá ao Delegado de Polícia consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa minudente para afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários. Na hipótese de prisão por quantidades inferiores à fixada no item 4, deverá o juiz, na audiência de custódia, avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio. A apreensão de quantidades superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário. Classe e Número: RE 635.659 (Tema 506 da Repercussão Geral)

Execução invertida não pode ser imposta à Fazenda Pública no cumprimento de sentença comum

Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no âmbito de cumprimento de sentença comum (procedimento ordinário), não é cabível determinação judicial que obrigue a Fazenda Pública a apresentar, como devedora na fase de execução, os cálculos e o valor atualizado do débito – procedimento conhecido como execução invertida. Relator do caso, o ministro Herman Benjamin destacou em seu voto que a execução invertida é uma construção jurisprudencial – ou seja, não tem previsão expressa na lei – e representa a modificação do rito estabelecido pelo Código de Processo Civil, segundo o qual, como regra, cabe ao credor a apresentação dos valores atualizados do débito. De acordo com posicionamento do STJ – explicou o ministro – o fundamento da execução invertida é a conduta espontânea da parte devedora, a qual busca se antecipar na apresentação dos cálculos e, como recompensa, ter o benefício de não ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios, além de acelerar o trâmite da ação. O relator lembrou que essa técnica de execução é importante nas causas previdenciárias, especialmente nas ações em curso nos juizados especiais. Sobre esse tema, lembrou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 219, considerando legítimo que a União, nas ações dos juizados em que figure como ré, apresente os cálculos necessários à execução de natureza previdenciária. “Conquanto abrangente, por tratar-se de ação constitucional, o precedente acima possui nuanças próprias, dentre as quais os próprios limites de aplicabilidade do precedente jurisprudencial: decisões proferidas pelos juizados especiais”, ponderou. Execução invertida pode ser adotada pela Fazenda Pública, mas não de maneira impositiva Para Herman Benjamin, embora relevantes, os princípios que fundamentam o microssistema dos juizados especiais não podem ser impostos automaticamente aos processos ordinários. O ministro ressaltou que, na esfera do Código de Processo Civil, outros princípios e orientações prevalecem, a exemplo do princípio da cooperação e da boa-fé. No caso analisado pela turma, o relator apontou que o tribunal de origem deveria ter intimado previamente a Fazenda Pública, ofertando-lhe a possibilidade do cumprimento espontâneo da sentença. Estando intimada, caberia à Fazenda decidir pela apresentação ou não dos cálculos e dos valores devidos, ciente de que, não o fazendo, ela assumiria a responsabilidade por eventual condenação em honorários advocatícios. “Recomendável que a Fazenda Pública adote, principalmente na seara previdenciária, o procedimento de antecipação voluntária na demonstração dos cálculos para execução. Desse modo, cumpriria o princípio da celeridade processual, bem como se desvencilharia de custos para o erário com condenações em honorários advocatícios (princípio da causalidade). Contudo, repita-se, tal procedimento, com base na jurisprudência do STJ, possui a característica primordial da espontaneidade da parte executada, não cabendo imposições cogentes da autoridade judicial”, concluiu o ministro. Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): AREsp 2014491

Embargos de declaração interrompem apenas prazo de recurso, não de outros meios de defesa ou impugnação

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os embargos de declaração Embargos de declaração (sigla EDcl), também chamados de declaratórios ou aclaratórios, são um tipo de recurso utilizado para corrigir omissões, contradições ou obscuridades da decisão judicial. interrompem o prazo apenas para a interposição de recursos, não sendo permitido conferir interpretação extensiva ao artigo 1.026 do Código de Processo Civil de 2015 para estender o significado de recurso para as demais defesas previstas no processo de execução. O entendimento foi estabelecido ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que, interpretando o artigo 1.026 do CPC, considerou que os embargos de declaração interrompem o prazo para interposição de qualquer defesa do devedor, incluindo a impugnação ao cumprimento de sentença. No entendimento do TJPR, o sentido da atribuição de efeito interruptivo de prazos aos embargos de declaração é o de não causar prejuízo à parte que os opõe. Assim, segundo o tribunal, a oposição dos embargos contra decisão que intimou o devedor para pagar voluntariamente a dívida ou impugnar a execução interrompeu o prazo para exercício dessas faculdades – mesmo porque, para a corte estadual, a depender do que fosse decidido sobre os embargos, o conteúdo da decisão anterior poderia ficar sem efeito. Como consequência desse posicionamento, o TJPR deu provimento a agravo de instrumento do executado para, revertendo decisão de primeiro grau, reconhecer a tempestividade de impugnação ao cumprimento de sentença. Interpretação extensiva do artigo 1.026 do CPC viola competência do Legislativo O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso da parte exequente, apontou que o TJPR, apesar de fundamentar a sua decisão em interpretação teleológica do CPC, na realidade, realizou interpretação extensiva do artigo 1.026 da lei processual, a fim de expandir o significado de recurso e abarcar no dispositivo qualquer defesa ajuizada pela parte executada. Entretanto, para o ministro, não é possível interpretar extensivamente o artigo 1.026 do CPC, sob pena de usurpação das competências do Poder Legislativo, tendo em vista que a expressão “recurso” não permite a extração válida do sentido mais amplo de “defesa ajuizada pelo devedor”. Antonio Carlos Ferreira também lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, o rol de recursos trazido pelo artigo 994 do CPC/2015 é taxativo. “Assim, por serem taxativas as hipóteses legais de recurso, não é possível atribuir interpretação extensiva ao texto normativo. Desse modo, confere-se previsibilidade e coerência na aplicação da lei, em observância à segurança jurídica que deve permear a hermenêutica das normas processuais”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso e julgar intempestiva a impugnação ao cumprimento de sentença. Leia o acórdão no REsp 1.822.287.

Verbas rescisórias de empregado falecido devem ser pagas a dependentes habilitados perante o INSS

Com o fim de se livrar da obrigação de pagar as verbas rescisórias de um empregado falecido, um condomínio residencial ajuizou ação de consignação em pagamento na Justiça do Trabalho. Por meio dessa modalidade de ação, o devedor procura se liberar da obrigação de pagar aquilo que entende como devido. Mas, ao decidir o caso, o juiz Alexandre Chibante Martins, titular da 3ª Vara do Trabalho de Uberaba, observou que, de acordo com normas legais que regem a matéria, as verbas rescisórias do trabalhador falecido devem ser pagas aos seus dependentes ou herdeiros, mediante a apresentação da certidão de dependentes habilitados perante o INSS ou do alvará judicial com a indicação dos herdeiros, expedido pela Justiça Comum. No caso, esses documentos não foram apresentados. Nesse contexto, o julgador concluiu que inexiste interesse de agir para a pretensão do ex-empregador, já que nem mesmo havia prova de quem seriam as pessoas que deveriam receber os créditos do falecido. O processo foi extinto sem resolução de mérito, em razão da ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válidos e regulares (artigos 485, inciso IV do CPC e 769 da CLT). Na sentença, o magistrado ainda ressaltou que foge ao objeto da ação de consignação em pagamento a discussão sobre quem teria legitimidade para receber valores que, eventualmente, seriam devidos em razão da extinção do contrato pela morte do trabalhador. Legislação aplicável O entendimento adotado pelo julgador se baseou na Lei 6.858/1980, que estabelece que os valores devidos pelos empregadores aos seus empregados, não recebidos em vida pelos titulares, serão pagos, em cotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento. Na decisão também houve referência ao Decreto 85.845/1981, que regulamentou esta lei. O artigo 2º do diploma legal dispõe que: “A condição de dependente habilitado será declarada em documento fornecido pela instituição de Previdência ou, se for o caso, pelo órgão encarregado, na forma da legislação própria, do processamento do benefício por morte.” O parágrafo único da norma, por sua vez, determina que conste da declaração, obrigatoriamente, o nome completo, a filiação, a data de nascimento de cada um dos interessados e o grau de parentesco ou relação de dependência com o falecido. Foi citado ainda o artigo 3ª desse decreto, segundo o qual, mediante a apresentação dessa declaração é que o empregador fará o pagamento das quantias devidas aos dependentes do empregado falecido. “Referido Decreto prevê como obrigação do empregador providenciar o pagamento dos valores devidos em vida ao falecido empregado a seus herdeiros, na forma da constatação no órgão previdenciário de quem esteja habilitado a recebê-los”, destacou o juiz. Para o magistrado, não prospera a alegação do empregador de que haveria dúvida de quem seriam os herdeiros do trabalhador e que, dessa forma, a ação de consignação e pagamento seria procedente. Isso porque, segundo pontuado na sentença, não se pode falar em dúvida de quem sejam os herdeiros habilitados antes de se valer da consulta à instituição de previdência social para se obter a documentação apta a revelá-los. Processo PJe: 0010740-08.2021.5.03.0152 (ConPag)

Não cabe cobrança de honorários advocatícios em caso de execução invertida

Não é cabível a fixação de honorários advocatícios na hipótese em que o devedor apresenta os cálculos para pagamento de pequeno valor, caso o credor concorde com a quantia apresentada, na chamada execução invertida. O entendimento foi reafirmado pela Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso interposto pelo Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs) contra decisão de pagar honorários advocatícios de R$ 250,00. O valor foi fixado pelo juízo de primeiro grau da comarca de Arroio do Meio (RS). O Ipergs recorreu dessa decisão ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) alegando que a fixação de honorários, em fase de execução, ocorre quando a parte condenada não cumpre espontaneamente a decisão judicial. Voluntário No caso em análise, o Ipergs destacou ter apresentado os cálculos de revisão do benefício de forma espontânea e que o autor da ação limitou-se a concordar com os cálculos apresentados. “Na realidade, sequer há que se falar em processo de execução, mas em cumprimento voluntário, pelo devedor, dos ditames da sentença de mérito”, justificou. O TJRS manteve a decisão do juiz, argumentando que o fato de o instituto apresentar os cálculos, antecipando-se ao credor, sem no entanto realizar o pronto pagamento, “não lhe dá o direito de se eximir de pagar a verba honorária postulada”. Inconformado, o Ipergs recorreu ao STJ. Alegou que, inexistindo execução, não há possibilidade de serem fixados novos honorários, “carecendo de fundamento legal a determinação de fixação de dois honorários advocatícios para um mesmo feito de conhecimento". Cobrança afastada No STJ, o caso foi relatado pelo ministro Herman Benjamin, da Segunda Turma, especializada em direito público. No voto, o ministro aceitou os argumentos apresentados pelo Ipergs para afastar a cobrança de honorários. Segundo o ministro, citando entendimento do STJ, “não cabe a fixação de verba honorária quando o executado (devedor) apresenta os cálculos do benefício para, no caso de concordância do credor, expedir-se a correspondente requisição de pequeno valor”. Leia o voto do relator. Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1593408