Ação de retificação de nome
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2021
14/12 - REsp 1.729.402-SP
Não é possível a alteração de patronímico de família, com a duplicação de uma consoante, a fim de adequar o nome registral àquele utilizado como assinatura artística. Informações do Inteiro Teor Inicialmente cumpre salientar que, o princípio da imutabilidade do nome não é absoluto no sistema jurídico brasileiro, de modo que o nome civil, conforme as regras insertas nos artigos 56 e 57 da Lei de Registros Públicos, pode ser alterado: a) no primeiro ano após o alcance da maioridade, desde que não prejudique os apelidos de família; ou b) ultrapassado esse prazo, excepcionalmente, por justo motivo, mediante oitiva do representante do Ministério Público e apreciação judicial. O sobrenome, apelido de família ou patronímico, enquanto elemento do nome, transcende o indivíduo, dirigindo-se, precipuamente, ao grupo familiar, de modo que a admissão de alterações/modificações deve estar pautada pelas hipóteses legais, via de regra, decorrente da alteração de estado (adoção, casamento, divórcio), ou, excepcionalmente, em havendo justo motivo, preceituado no artigo 57 da Lei n. 6.015/1973. Tratando-se, portanto, de característica exterior de qualificação familiar, afasta-se a possibilidade de livre disposição, por um de seus integrantes, a fim de satisfazer interesse exclusivamente estético e pessoal de modificação do patronímico. Nada obstante os contornos subjetivos do nome como atributo da personalidade e elemento fundamental de identificação do sujeito - seja no âmbito de sua autopercepção ou no meio social em que se encontra inserido -, o apelido de família, ao desempenhar a precípua função de identificação de estirpe, não é passível de alteração pela vontade individual de um dos integrantes do grupo familiar. Na hipótese dos autos, a modificação pretendida altera a própria grafia do apelido de família e, assim, consubstancia violação à regra registral concernente à preservação do sobrenome, calcada em sua função indicativa da estirpe familiar, questão que alcança os lindes do interesse público. Ademais, tão-somente a discrepância entre a assinatura artística e o nome registral não consubstancia situação excepcional e motivo justificado à alteração pretendida. O nome do autor de obra de arte, lançado por ele nos trabalhos que executa, pode ser neles grafado nos moldes que bem desejar, sem que tal prática importe em consequência alguma ao autor ou a terceiros, pois se trata de uma opção de cunho absolutamente subjetivo, sem impedimento de qualquer ordem. Todavia, a utilização de nome de família, de modo geral, que extrapole o objeto criado pelo artista, com acréscimo de letras que não constam do registro original, não para sanar equívoco, mas para atender a desejo pessoal, não está elencado pela lei a render ensejo à modificação do assento de nascimento. Informações Adicionais Doutrina (1) Outro direito fundamental da pessoa é o da identidade, que inaugura o elenco dos direitos de cunho moral, exatamente porque se constitui no elo entre o indivíduo e a sociedade em geral. Com efeito, o nome e outros sinais identificadores da pessoa são os elementos básicos de associação de que dispõe o público em geral para o relacionamento normal, nos diversos núcleos possíveis: familiar, sucessório, negocial, comercial e outros. Cumpre, aliás, duas funções essenciais: a de permitir a individualização da pessoa e a de evitar confusão com outra. Possibilita seja a pessoa imediatamente lembrada, mesmo em sua ausência e a longas distâncias. Nesse sentido, aliás, a imagem e a voz também cumprem, a par de outros caracteres pessoais, a missão exposta, sob âmbito mais restrito, exigindo a prévia fixação e maior esforço associativo; mas, de qualquer sorte, nesse passo, atestam a contínua interpenetração dos direitos da personalidade de já referida. (Bittar, Carlos A. Os Direitos da Personalidade, 8ª edição. Disponível em: Minha Biblioteca, Editora Saraiva, 2014. p. 195). (2) É aspecto distintivo da procedência familiar no meio social, pertencendo a todo grupo familiar, indistintamente, como entidade. Justamente por isso não pode ser descartado pelo indivíduo que o ostente, dado que não é possível dispor daquilo que não pertence a cada um individualmente, apenas em conjunto, do grupo familiar com um todo. Tudo no sobrenome é essencial, acentua Humblet. A forma maiúscula ou minúscula das letras, a justaposição ou a separação das sílabas, os traços de união, acentos, tremas, apóstrofes, enfim, todos os sinais gráficos que porventura revelem em sua grafia original, excetuando-se, naturalmente, os casos de erro; frisando que ’não somente as diversas sílabas que constituem o nome e lhe dão individualidade: é também a ortografia." (RODRIGUES, Marcelo. Tratado de Registros Públicos e Direito Notarial. 3 ed. Salvador: JusPodivm, 2021, p. 114 e 119). Legislação Constituição Federal, art. 1º, III; Lei n. 6.015/1973, art. 56 e 57.