Contencioso de anulação
-
2024
13/08 - Sistema do contencioso administrativo
O sistema do contencioso administrativo é um modelo de controle jurisdicional que se originou na França e foi disseminado para outros países, caracterizando-se pela separação entre a jurisdição administrativa e a jurisdição comum. Este sistema emergiu a partir das tensões históricas entre o Parlamento e os Intendentes durante o final da Monarquia Francesa, quando as funções jurisdicionais e administrativas estavam profundamente interligadas. Origem e Evolução A Revolução Francesa de 1789, influenciada pelas ideias de Montesquieu sobre a separação dos Poderes, promoveu uma significativa transformação na estrutura do controle judicial da Administração Pública. A Lei de 24 de agosto de 1790 estabeleceu a separação rígida entre funções judiciárias e administrativas, proibindo os juízes de intervir nas atividades dos corpos administrativos sob pena de prevaricação. A Constituição de 3 de agosto de 1791 reforçou essa separação, impedindo os tribunais de interferirem nas funções administrativas ou de convocar administradores por atos funcionais. Características do Sistema O sistema do contencioso administrativo francês fundamenta-se na existência do Conselho de Estado, que atua como a principal instância jurisdicional para a revisão dos atos administrativos. O Conselho de Estado possui um papel multifacetado, atuando como: Juízo de Apelação: Revisa as decisões dos Tribunais Administrativos e dos Conselhos de Contencioso Administrativo das Colônias. Juízo de Cassação: Controla a legalidade das decisões do Tribunal de Contas, do Conselho Superior da Educação Nacional e da Corte de Disciplina Orçamentária. Juízo Originário e Único: Julga determinados litígios administrativos de forma exclusiva e primordial. Funções e Procedimentos O Conselho de Estado tem atribuições tanto administrativas quanto contenciosas. Suas funções incluem a expedição de avisos consultivos ao governo e o julgamento de litígios administrativos. A estrutura do Conselho de Estado é complexa, composta por cerca de duzentos membros, entre funcionários de carreira, auditores, juristas e conselheiros. Ele é dividido em seções administrativa e contenciosa, com esta última subdividida em várias subseções. No que diz respeito ao tipo de controle jurisdicional, o Conselho de Estado lida com quatro principais formas de contencioso: Contencioso de Plena Jurisdição: Relacionado ao restabelecimento de direitos do litigante, reparando danos causados pela Administração. Contencioso de Anulação: Envolve a invalidação de atos administrativos considerados ilegais, seja por violação da lei, da moralidade ou por desvio de poder. Contencioso de Interpretação: Foca na interpretação dos atos administrativos e seus efeitos sobre o litigante. Contencioso de Repressão: Trata da imposição de penas administrativas por infrações específicas, como infrações de trânsito ou atentados ao domínio público. Críticas e Considerações Embora o sistema francês de contencioso administrativo seja altamente especializado e estruturado, não está isento de críticas. Uma das principais objeções é a existência de dois critérios distintos de justiça: o da jurisdição administrativa e o da jurisdição comum. Críticos como Ranelletti apontam que um Estado moderno de Direito deve assegurar uma justiça única e integrada, garantindo que tanto a Administração quanto os indivíduos tenham seus direitos fundamentais protegidos por um sistema judicial equânime e independente. O modelo francês, com seu Conselho de Estado predominantemente constituído por membros da própria Administração, pode não oferecer as garantias de independência necessárias para a imparcialidade judicial. Além disso, a complexidade e a peculiaridade do sistema francês podem levar a dificuldades de aplicação e interpretação em outros contextos internacionais. Embora o sistema tenha sido adaptado em países como Suíça, Finlândia, Grécia, Turquia, Polônia e nas antigas Iugoslávia e Tchecoslováquia, a sua estrutura pode não oferecer vantagens claras sobre o sistema judiciário de jurisdição única, que busca integrar o controle jurisdicional em uma única esfera judicial, garantindo uniformidade e coerência na aplicação da justiça.