Maconha
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2024
26/06 - Porte de pequena quantidade de maconha para uso pessoal
Fatos Trata-se de recurso extraordinário, com repercussão geral (Tema 506), em que se discute se a posse de pequenas quantidades de maconha para uso pessoal deve ser considerada crime. No caso, uma pessoa foi condenada à pena de prestação de dois meses de serviços à comunidade por portar 3 gramas de maconha para consumo próprio. A Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) estabelece que o uso de drogas é crime, mas não prevê a aplicação da pena de prisão (art. 28). A Lei diz que o usuário poderá ser punido com: (i) advertência sobre os efeitos das drogas; (ii) prestação de serviços à comunidade; e (iii) medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. O tráfico de drogas é punido com pena de prisão (art. 33). Questões jurídicas A posse de pequena quantidade de maconha deve ser considerada crime? Qual critério deve ser usado para diferenciar os usuários de maconha dos traficantes? Fundamentos da decisão O STF decidiu que ter pequenas quantidades de maconha para uso pessoal (40 gramas ou 6 pés) continua sendo proibido, mas não é crime. Por isso, no caso analisado, a pessoa condenada pela posse de 3 gramas de maconha para consumo próprio foi absolvida do crime. A decisão se baseia nos direitos à privacidade e à liberdade individual (art. 5º, X, da Constituição). Reconhece, ainda, que tratar o uso de maconha como crime incentiva atividades criminosas associadas ao tráfico, mas não reduz o consumo. Se uma pessoa for flagrada usando maconha, a droga será apreendida. As medidas de advertência e comparecimento a programa ou curso educativo, previstas no art. 28 da Lei de Drogas, continuarão a ser aplicadas como sanções administrativas, sem produzir efeitos penais. Por exemplo: a pessoa que for pega usando maconha não terá registro na ficha criminal. Como a Lei de Drogas não definiu a quantidade de maconha que caracteriza consumo pessoal, atualmente, a Polícia, o Ministério Público e o Poder Judiciário avaliam em cada caso se os acusados devem ser considerados usuários ou traficantes. A ausência de um critério preciso faz com que a lei seja aplicada de forma desigual. Enquanto jovens brancos e de classe média têm chances maiores de serem considerados usuários, é mais comum que jovens pobres, negros e pardos sejam considerados traficantes. Para evitar isso, o STF definiu um critério claro e objetivo: como regra geral, quem estiver com até 40 gramas ou 6 pés de maconha deve ser considerado usuário. Essa regra valerá até que o Congresso Nacional crie uma nova lei sobre o assunto. Esse critério não é absoluto, mas uma presunção relativa que pode ser afastada se ficar provado que a droga não seria usada para consumo próprio. Por exemplo: se uma pessoa for encontrada pela polícia com menos de 40 gramas de maconha, mas estiver com embalagens, balanças ou registros de venda, poderá ser presa em flagrante por tráfico. O consumo de drogas é algo ruim e deve ser desestimulado. Por isso, o governo deve criar programas educativos para esclarecer os riscos do uso de drogas e fornecer tratamento de saúde para os dependentes. Além disso, deve criar órgãos com especialistas em saúde pública para aplicar medidas de apoio aos usuários. Votação e julgamento Decisão por maioria Voto que prevaleceu: Min. Gilmar Mendes (relator) Voto(s) divergente(s): Min. André Mendonça, Min. Nunes Marques, Min. Cristiano Zanin, Min. Dias Toffoli e Min. Luiz Fux. Resultado do julgamento Por maioria, o STF definiu que o porte de maconha para consumo pessoal não é crime e deve ser considerado uma infração administrativa, sem consequências penais, como registro na ficha criminal, por exemplo. As sanções, nesse caso, seriam advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento a programa ou curso educativo. A quantidade de 40 gramas de cannabis sativa e de seis plantas fêmeas foi estabelecida como critério para diferenciar o usuário do traficante. Esse critério, porém, não é absoluto. A autoridade policial poderá apreender a droga e prender a pessoa em flagrante mesmo se a quantidade for inferior, se houver indicativos de intenção de tráfico, como embalagem da substância, registro de operações comerciais e instrumentos como balança. O delegado, nesse caso, deverá detalhar as razões para a medida, que não poderá se basear em critérios arbitrários, sob pena de responsabilidade civil, disciplinar e penal. O juiz responsável por avaliar o caso, por sua vez, poderá afastar o enquadramento como crime caso haja provas suficientes da condição de usuário. Ainda de acordo com a decisão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em articulação com o Executivo e o Legislativo, deverá adotar medidas para cumprir a decisão, além de promover mutirões carcerários para corrigir prisões que tenham sido decretadas fora dos parâmetros determinados pelo Plenário. Tese de julgamento: Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III). As sanções estabelecidas nos incisos I e III do art. 28 da Lei 11.343/06 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta. Em se tratando da posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em Juízo, na forma do regulamento a ser aprovado pelo CNJ. Até que o CNJ delibere a respeito, a competência para julgar as condutas do art. 28 da Lei 11.343/06 será dos Juizados Especiais Criminais, segundo a sistemática atual, vedada a atribuição de quaisquer efeitos penais para a sentença. Nos termos do §2º do artigo 28 da Lei 11.343/06, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito. A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes. Nesses casos, caberá ao Delegado de Polícia consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa minudente para afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários. Na hipótese de prisão por quantidades inferiores à fixada no item 4, deverá o juiz, na audiência de custódia, avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio. A apreensão de quantidades superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário. Classe e Número: RE 635.659 (Tema 506 da Repercussão Geral)